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Com licença, precisamos falar sobre as mulheres e o futebol
"Praia e Sol, Maracanã e futebol...": já dizia o cantor Bebeto, nos anos 80, na sua canção de sucesso. É impossível olhar um dia de sol e não pensar: "hoje é dia de 'jogar bola' com os garotos". O futebol é uma das maiores paixões do brasileiro. Alguém uma vez me disse: "todo mundo tem um time. Todo mundo!". E, sabe, eu acredito. Não há quem resista a um estádio cheio, uma torcida inflamada empurrando seu time para vitória.
5 de setembro de 2010. Foi a data que eu fui ao estádio pela primeira vez, com meu pai. Não vou dizer qual é meu time por ética-jornalística, mas foi inevitável não chorar diante do anel do velho Maracanã todo vermelho e preto. No rádio, o narrador dava a emoção, na arquibancada a torcida batia no ritmo do coração. Eu não sabia nem torcer. Era pra brigar, discutir, xingar ou era para observar e deixar "o jogo me levar"? Não havia emoção maior do que aquela. Tenho certeza que você está lendo isso e lembrando da sua primeira vez num jogo.
Tudo isso é lindo, mas é uma pena que toda referência caia no sexo masculino. São os PAIS que levam os filhos, são os HOMENS que jogam bola, afinal isso não é coisa de mulher, né? Errado!
Há um tempo parei para acompanhar o futebol feminino. Lembro-me de um jogo, não tenho certeza de quais eram as equipes, mas não eram as seleções consideradas do alto padrão: EUA, Brasil, Canadá e etc. Lembro-me de achar as goleiras, especificamente, de nível baixo, as jogadoras sem fundamentos como domínio e passe. Na hora, pensei: "Meu Deus! Elas não passaram numa escolinha"? Foi quando me atentei que não há essa escolinha. As categorias de base são voltadas para formação de atletas homens. Como podemos exigir que o futebol feminino seja rentável, visível, bom, se não há investimento? Enquanto a prioridade for formar jogadores e não seres humanos/cidadãos/homens, sempre haverá o preconceito e o machismo com o futebol feminino.
O preconceito enraizado não é só dentro das quatro linhas, é fora delas também. Ele aparece quando surgem comentários: "Ela não sabe o que está falando. O que mulher entende de futebol"? Veja como nem torcer ou ser especialista no assunto pode. Ainda assim, a Fox Sports Brasil teve a iniciativa de colocar uma narradora mulher na Copa, algumas mulheres têm seus programas no Sportv e Rádio Globo. Por sinal, o Sportv acabou de transmitir o Pré-Mundial Feminino e vai transmitir a Copa do Mundo que será em Paris (França).
Ainda com todas dificuldades, o brilho feminino permeia as glórias de um esporte mal tratado nesse segmento. E esse brilho aparece no quesito conquistas. Vou enumerar para você o que o Brasil tem no currículo.
- Campeã Mundial de handebol para um público de 20 mil pessoas na Sérvia em 2013;
- Campeã Mundial de basquete em 1994 em cima dos EUA;
- Campeã no futebol nas edições do Pan-Americano de 2003, 2007 e 2015;
- Campeã Olímpica (medalha de Ouro) de vôlei em 2008 e 2012 em Pequim e Londres, respectivamente;
- Campeã Olímpica (medalha de Ouro) e Campeã Mundial em 2016 e 2018, respectivamente, de Iatismo (barco a vela);
- O Brasil tem algumas das maiores ginastas do Mundo como Jade Barbosa, Danielle Hipólyto e a ex-ginasta Daiane dos Santos;
- Campeã Mundial e Olímpica de Vôlei de Praia com Sandra Pires e Jackie Silva;
- Campeã Olímpica (medalha de Ouro) em Pequim (2008) com Maurren Maggi no salto em distância (a primeira brasileira a conquistar um título olímpico em evento individual);
- Campeã Olímpica (medalha de ouro) no Judô até 57kg com Rafaela Silva no Jogos Olímpicos do Rio em 2016;
- A melhor jogadora de futebol do mundo: Marta;
- Duas das maiores atletas da história do basquete profissional: Hortência e Magic Paula;
- Duas campeãs em categorias diferentes no UFC são brasileiras*: Amanda Nunes no peso-galo (até 61kg) e Cris Cyborg no peso-pena (até 66kg).
Apesar de todas conquistas que parecem ser sigilosas (isso porque não é comum ver citações sobre os títulos), o esporte sobrevive. Ainda que a oportunidade não venha, as craques mostram nos pés que merecem ser olhadas com outros olhos. Nós estamos desperdiçando grandes jogadoras por causa do machismo, do preconceito e do não-investimento. Por exemplo... Onde a espetacular Marta joga? Eu respondo: Orlando Pride (EUA). Assim como outras jogam no PSG (França), Barcelona (Espanha) e até na Suécia. Nossas atletas estão indo para outros países que nem têm tradição futebolística porque nós achamos aqui que isso não é "coisa de menina" então não há espaço para elas.
Chegou a hora de mudar, chegou a hora de começarmos a olhar para fora da nossa caixinha. Pais levem suas filhas nos estádios, filhos joguem bola com suas irmãs, mulheres avante!
Feliz dia de luta!
Do Plantão Enfoco para todas as Guerreiras do Brasil e do Mundo!
Filipe Vianna- Blog Segue o Jogo
*Este fato ocorreu até Amanda Nunes vencer Cyborg e conquistar o cinturão de outra
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