Reflexão

Honestidade intelectual e a busca pela verdade

Um caminho tortuoso e muitas das vezes solitário

O filosofo Sócrates preferiu a morte a desmentir seus próprios ensinamentos
O filosofo Sócrates preferiu a morte a desmentir seus próprios ensinamentos |  Foto: Arte / Divulgação
 

Analisando o cenário político atual, a enxurrada de temas controversos e opiniões divergentes, que nos chegam diariamente, a intensa polarização de ideias no mundo moderno, e a dificuldade de se perquirir o que é verdadeiro ou falso, resolvi escrever sobre o tema do título.

Um filósofo é aquele que busca a verdade. Ser honesto intelectualmente é entregar a verdade, independentemente de qualquer circunstância, aos outros. Acima de tudo, ser verdadeiro é encontrar o real sentido das coisas, assumindo o compromisso pessoal de não afastar-se disso, haja o que houver.

Infelizmente, é bem fácil constatar que o mundo moderno não se baseia nessa premissa. Estamos dominados por narrativas e, aparentemente, o mais esperto é aquele que faz o melhor uso da retórica. Mas o que seria isso?

Sofismo

A retórica é uma prática muito antiga, a qual era amplamente utilizada na Grécia Antiga. Não existiam, há 2500 anos, filósofos, mas apenas sofistas: homens que faziam a interpretação da realidade à maneira que lhes fosse conveniente e ensinavam oratória sob a forma de retórica.

Bons oradores eram aqueles que, valendo-se da menor quantidade de argumentos possível (fossem esses verdadeiros ou não), detinham em sua fala um alto poder de convencimento, ao que era dado o nome de retórica.

Em meio a esse cenário, surgiu Sócrates, o primeiro filósofo da humanidade: um homem simples que, vestido com andrajos, caminhava pelas ruas de Atenas falando para a população. Sócrates buscava, acima de tudo, a verdade, denunciando o mau uso da oratória, sob forma de retórica, para fins políticos e de convencimento do povo, que, sem acesso à realidade, era capturado por narrativas.

Isso nos traz ao momento atual, e à infinidade de narrativas que inundam a cena pública. Vejamos: Sócrates foi um homem comprometido com a busca da verdade. Sua honestidade intelectual foi o que fez com que fosse seguido pela juventude da época, incomodasse os políticos de Atenas, fosse julgado e condenado.

Filosofia

Por causa dessa mesma honestidade, preferiu ingerir cicuta e morrer envenenado, a desmentir publicamente os próprios ensinamentos. Entrou para a História, tendo sido considerado, no templo de Delfos, o homem mais sábio de seu tempo, e inaugurando a ciência da FILOSOFIA – o amor pelo saber.

O que vemos, hoje, em nada se assemelha a isso. As pessoas acostumaram-se a uma relativização do certo e do errado, não comprometendo-se com opiniões definitivas acerca de tema algum. Ao mudarem de ideia, acreditam que estão, apenas, transitando entre várias possibilidades, o que faz com que nada seja moralmente condenável, dependendo da sua explicação.

E as narrativas são construídas pelos mestres da retórica, por meio de discursos convincentes, que capturam muitos desavisados. A oratória, de forma similar à que ocorria em Atenas, muitas vezes convence pela eloquência, embora esteja esvaziada de ideias, argumentos e verdade.

E como saber distinguir, nesse mundo virado de ponta cabeça, o que é verdadeiro, o que é mera narrativa, o que está eivado de vícios e o que tem compromisso com a honestidade intelectual? Bem, só há um caminho: você deve estudar, beber das fontes certas, aprender História, treinar o ouvido, observar a realidade e acreditar no que seus olhos vêem, e não no que desejam que você acredite.

Sobretudo, é preciso tecer comparações sobre o agora e alguns outros períodos históricos, analisando as consequências de situações que se repetem, ao longo da trajetória da civilização, que é cíclica. No estudo dos clássicos da História, na leitura de grandes biografias e com o acompanhamento da trajetória de grandes homens, podemos extrair ensinamentos preciosos para a compreensão do que vivemos e para a observância da desonestidade intelectual, que domina as narrativas da modernidade.

Comunicação em massa

Nunca foi tão fácil atingir tantas pessoas, com os recursos da internet, da mídia, da televisão e de outros veículos poderosos de comunicação em massa, à disposição. Nunca, na Humanidade, chegou-se a tanta gente, com tão pouco esforço. E jamais foram vistas tantas narrativas, ao mesmo tempo.

A busca pela verdade

Portanto, amigos, meu conselho é que, na busca da verdade real, da certeza sobre os fatos e da formação de uma opinião robusta, alicerçada em elementos de convicção, sejam feitas algumas perguntas básicas, acerca da fonte – é ou não confiável; do tema- é ou não controvertido; da narrativa- é esclarecedora, ou deixa no ar perguntas e provocações; do desenrolar da ação- é coerente ou tem falhas, buracos, interrogações; do autor – é ou não alguém a cujo discurso pode-se dar credibilidade.

Ultrapassadas essas primeiras perguntas, o caminho se tornará mais claro e será possível avançar com um pouco mais de segurança. Entretanto, é imprescindível treinar sua capacidade analítica, a fim de não incorrer em erros simples, que podem contaminar seu julgamento.

Encontrar a verdade é um caminho tortuoso e muitas das vezes, solitário. Ao percebermos a inconsistência de caráter e de personalidade de alguns, vamos nos distanciando de comportamentos e de pessoas. Simplesmente, não é mais possível conviver com determinado tipo de gente.

Do mesmo modo, ao notarmos o quanto o mundo é vasto e repleto de coisas para aprendermos, vamos nos aprofundando no estudo e na observância criteriosa da realidade. De todo esse movimento, começa a emergir a sabedoria.

E como é bom ser um pouco mais sábio, entender alguns dos mistérios da vida e compreender como caminha a humanidade! Vale a pena buscar a honestidade intelectual? Não só vale, como transforma a vida de quem o faz! 

Erika Figueiredo - Filosofia de Vida

Erika Figueiredo - Filosofia de Vida

A niteroiense Erika Rocha Figueiredo é escritora, professora e promotora de justiça

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