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'País onde não pode ser preto', morte reforça atenção ao racismo

Publicado às 18h34. Atualizado às 18h52.

Imagem ilustrativa da imagem 'País onde não pode ser preto', morte reforça atenção ao racismo
Familiares e amigos mostraram revolta com a morte de Durval. Foto: Alex Ramos
"Queremos justiça por Durval!"

O pedido de familiares e amigos de Durval Teófilo Filho, de 38 anos, fez coro na tarde desta sexta-feira (4) durante o enterro do rapaz no Cemitério São Miguel, em São Gonçalo. Acontece que Durval morreu ao ser confundido com um bandido, por um militar da Marinha na última quarta-feira (2).

A cerimônia de velório contou com cartazes pedindo justiça e com a súplica: 'vidas negras importam'. A irmã da vítima, Fabiana Teófilo, acusa racismo por parte do militar.

"A pessoa sai para trabalhar e não tem o direito de voltar para casa. Eu sinto muita raiva em relação ao racismo. Nós vivemos em um país onde não pode ser preto. A gente não pode entrar em mercado e lojas que tem gente atrás. Agora, não podemos entrar nem na nossa própria casa? Preto não pode mais morar no Brasil, é o que eu estou sentindo. Tem que ter justiça. Se a gente se calar, aí mesmo que a justiça não vem. Ele não foi o primeiro e, que pena, não será o último"

Justiça

"A esperança é de fazer justiça. Eu não sei qual é o critério para virar militar nesse país. Não é a primeira vez que isso acontece. Meu irmão era trabalhador e eu vou correr atrás porque eu quero justiça. Quero que ele fique preso e responda por liberdade. É lutar pela pena máxima"

Fabiana Teófilo, irmã da vítima

Durante o velório na Capela Nova São Gonçalo, em frente ao cemitério, familiares e amigos souberam que a autuação do militar mudou: agora, ele vai responder por homicídio doloso, quando há intenção de matar.

Durval trabalhava como repositor de supermercado em São Gonçalo. Amigos levaram cartazes para combater o racismo e prestar as últimas homenagens ao companheiro de trabalho.

"A única coisa que a gente busca é que a justiça seja feita. Se fosse uma pessoa branca, o final não seria esse. A situação do negro no Brasil é complicada. Podemos dizer que os negros são praticamente caçados. Uma sensação de alívio com a mudança da autuação. A gente busca sempre o respeito e a igualdade entre todos. Vidas negras importam muito"

Thiago Lima, amigo

Durval era casado e deixa uma filha de seis anos. A criança estava esperando pelo pai na janela de casa quando o crime aconteceu e estava ansiosa para começar a escola nesta segunda-feira (7). Segundo Luziane Teófilo, Durval era visto como um super-herói pela filha.

"Mataram um pai de família quando estava chegando ao trabalho. Sem direito a defesa nenhuma. Ele não merecia isso. Mesmo falando que era morador, o assassino foi lá e deu um tiro na coxa. Eu não vou perdoar. Eu vou lutar por justiça. Ninguém veio pedir perdão e prestar assistência, mas eu também não quero que falem. Eu espero que o senhor esteja feliz. Parabéns por destruir a minha vida e a da minha família. Ele estava se preparando para levar a filha segunda-feira para a escola. E agora, é o senhor que vai levar ela para escola? É o senhor que vai contar história para dormir? Ela chamava o Durval de super-herói e tinha o melhor pai do mundo."

O caso

https://youtu.be/sLlRSxgvIt8
Imagens revelaram os momentos em que o militar atirar da vítima. Imagens: reprodução

Durval morreu ao ser baleado por um morador do mesmo condomínio, um militar da Marinha, que o confundiu com um ladrão na noite desta quarta-feira (2). O caso aconteceu na porta de um conjunto residêncial na Rua Capitão Juvenal Figueiredo, no Colubandê, em São Gonçalo.

A vítima estava chegando em casa procurando a chave do portão do condomínio quando foi surpreendida por disparos de arma de fogo ao se aproximar do marinheiro. O militar estava em seu carro e não tinha conseguido abrir o portão automático.

Segundo a perícia, os tiros atingiram a barriga da vítima, que chegou a ser socorrida pelo autor ao Hospital Estadual Alberto Torres (Heat), no Colubandê, mas não resistiu ao ferimento. O laudo do Instituto Médico Legal de Tribobó concluiu que a causa da morte foi hemorragia interna causada por projétil de arma de fogo.

De acordo com a Polícia Militar, o marinheiro foi levado para a Divisão de Homicídios de Niterói e São Gonçalo (DHNSG). Na especializada, ele confirmou que não reconheceu Durval, que estava se aproximando rapidamente do veículo, mexendo em uma mochila.

Ainda em depoimento, o militar confessou ter efetuado um disparo, para depois atirar mais duas vezes. Após os tiros, verificou que o homem morava no mesmo condomínio e o levou para o hospital.

O marinheiro foi autuado primeiramente por homicídio culposo, quando não há intenção de matar. Uma fiança foi estipulada em R$ 120 mil. No entanto, o autor do crime continua preso no presídio da Marinha, no Centro do Rio, e agora irá responder por homicídio doloso, quando há intenção de matar.

A Marinha do Brasil, questionada sobre o ocorrido, informou estar colaborando com os órgãos responsáveis para a elucidação do fato. A Marinha lamentou o ocorrido.

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