Pesquisa

Componente da cerveja pode combater chikungunya e oropouche

Estudo aponta compostos antivirais

O lúpulo é reconhecido mundialmente por conferir amargor às cervejas
O lúpulo é reconhecido mundialmente por conferir amargor às cervejas |  Foto: Arquivo / Marcelo Eugênio
 

O lúpulo, reconhecido mundialmente por conferir amargor às cervejas, se provou não apenas como um ingrediente essencial na indústria cervejeira, mas também como uma promissora fonte de compostos antivirais.

Isso de acordo com um estudo liderado pela pesquisadora búlgara Tsvetelina Mandova em colaboração com o professor Fernando Batista da Costa, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP) da USP.

Conduzida desde 2019, a pesquisa identificou substâncias antivirais no lúpulo capazes de combater vírus como chikungunya e oropouche.

Como acontece?

De acordo com Tsvetelina, os resultados revelam pelo menos duas hipóteses sobre o mecanismo de ação do lúpulo contra a replicação viral, sendo complementares entre os vírus chikungunya e oropouche.

"Mas, como os dois vírus são diferentes em termos do tipo de material genético e do modo como se replicam na célula após a infecção, as duas abordagens que usamos diferem. O que é comum é que, para ambos os vírus, os compostos do lúpulo apresentam atividade inibitória, o que significa que podem interagir em diferentes estágios da replicação viral e interromper a propagação", explica Tsvetelina ao G1.

Os experimentos, realizados em modelos de células de mamíferos que simulam as células hospedeiras dos vírus, apontaram para uma significativa ação de inibição contra ambos os vírus, especialmente nos compostos contendo beta ácido, destacando-se como os mais promissores.

"O processo incluiu o desenvolvimento do método de separação dos compostos ativos. Estávamos focados em três grupos de compostos e utilizamos métodos de separação chamados cromatografia líquida/líquida. O segundo passo foi confirmar a estrutura por meio de métodos estruturais como RMN ou espectrometria de massa ou métodos analíticos como HPLC. A terceira parte foi organizar a parte antiviral e testá-la in vitro em modelos celulares", detalha. 

Segundo a pesquisadora, no  vírus oropouche, foram feitas análises computacionais.

"Modelamos por software alguns dos compostos do lúpulo e como eles se conectariam com uma proteína chave do processo de replicação do vírus na célula hospedeira. Depois de termos os resultados para ambos os vírus, tanto o chikungunya quanto o oropouche, formulamos a hipótese de um mecanismo de ação plausível, com base no perfil químico de medicamentos antivirais, juntamente com princípios biomoleculares e elementos na replicação viral", conclui. 

Para o professor Costa, embora a pesquisa ainda esteja em estágios iniciais, os resultados são encorajadores e indicam um potencial terapêutico significativo.

Desafios

Ambos os vírus, chikungunya e oropouche, são arboviroses transmitidas principalmente por mosquitos, representando um desafio significativo para a saúde pública.

Enquanto o primeiro já apresenta dispersão territorial no Brasil, o último, apesar de um caso registrado no Rio de Janeiro no início deste ano, ainda não representa uma ameaça iminente de surto nacional.

Diante da falta de medicamentos específicos ou vacinas para essas doenças, a pesquisa sobre os benefícios medicinais do lúpulo oferece uma nova perspectiva no combate a essas enfermidades.

Pesquisa promissora

A pesquisadora Tsvetelina Mandova enfatiza que os resultados preliminares obtidos até o momento em sua pesquisa são promissores e motivam a continuidade dos trabalhos. No entanto, ela ressalta que o caminho para transformar as descobertas em vacinas ou medicamentos enfrenta diversos obstáculos.

"É importante lembrar que, para que uma molécula com atividade biológica, neste caso antiviral, se torne um medicamento (comprimido ou vacina), o caminho é longo e repleto de muitos obstáculos a serem superados. Acredito que os resultados são promissores para continuar os estudos e validar por meio de outros testes esses primeiros resultados preliminares interessantes. Espero que nossa pesquisa seja o primeiro passo nessa direção de estudar esses compostos no contexto de arboviroses", enfatiza.

No Brasil, todos esses processos são rigorosamente monitorados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para garantir que sigam os padrões científicos estabelecidos.

Cultivo

O lúpulo, uma planta trepadeira pertencente à família Cannabaceae, tem se destacado não apenas por seu papel na produção de cerveja, mas também por suas propriedades medicinais e semelhanças com a Cannabis.

Integrante do grupo das angiospermas, o lúpulo produz agrupamentos de flores que conferem à planta aroma, amargor e outras características valorizadas pela indústria cervejeira.

Para que o lúpulo floresça, são necessárias condições ideais, incluindo alta incidência de luz solar, solos férteis e úmidos, grande quantidade de água e temperaturas amenas.
  

O cultivo requer estruturas adequadas para suportar o crescimento vertical dos ramos, que podem atingir até nove metros de altura. Em alguns países, como o Brasil, são utilizadas técnicas de suplementação luminosa artificial para garantir a alta taxa de incidência de luz necessária ao crescimento saudável da planta.

Embora seja cultivado principalmente em regiões estratégicas no hemisfério Norte, o lúpulo começou a atrair a atenção dos produtores brasileiros a partir de 2015, com sinais de desenvolvimento promissor no país.

Nos últimos anos, a produção nacional registrou um crescimento acelerado, conforme dados da Associação Brasileira de Produtores de Lúpulo (Aprolúpulo). Entre 2022 e 2023, houve um aumento de mais de 40% no número de produtores da planta.

Com esses resultados positivos, a perspectiva a médio e longo prazo é que o Brasil conquiste a tão almejada independência da importação de lúpulo. 

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