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    Etarismo! Mulheres revelam discriminação em seleção de emprego

    Trabalhadores apontam fatores de tratamento desigual em pesquisa

    Publicado 23/03/2025 às 8:23 | Autor: André Silva
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    As mulheres se queixam mais de discriminação do que homens, segundo a pesquisa
    As mulheres se queixam mais de discriminação do que homens, segundo a pesquisa |  Foto: Reprodução / Banco de imagem myloview

    Uma jornalista de 37 anos contou ao ENFOCO que já passou por situações em que sua idade foi usada como critério para desqualificação em seleção de emprego. Este, no entanto, não é um caso isolado, segundo pesquisa que revelou que 33% dos brasileiros afirmam ter sido tratados de forma desigual ou discriminatória em processos seletivos. 

    O "Panorama de Empregabilidade 2025", realizada em parceria pelas empresas Offerwise e Sólides, mostra ainda que quando se trata de mulheres, 42% delas relataram preconceito contra 23% entre os homens. Entre os fatores de discriminação mais mencionados estão o etarismo (44%), classismo (27%) e padrões estéticos (26%).

    O etarismo é uma das formas de discriminação mais presentes no mercado de trabalho. A percepção de que a idade pode ser um impeditivo para a contratação está enraizada em muitos processos seletivos, especialmente entre as mulheres.

    "Em uma das entrevistas, a recrutadora interrompeu a conversa dizendo que estavam buscando pessoas que não fossem muito sêniores. Eu questionei se estava sendo classificada pela idade, já que nem haviam ouvido todas as minhas qualificações. É chamar a gente de 'velha' a partir dos 30", disse a jornalista que preferiu não se identificar destacando a realidade de muitas mulheres que, mesmo com experiência, são consideradas “velhas” para o mercado.

    "Vi um edital que limitava a idade das candidatas a 30 anos, sem qualquer justificativa de que fosse necessário para a função", completou, que acredita que a idade não deveria ser um critério para avaliar a competência de um profissional.

    A CEO da RHF Talentos, Renata Freires, explica que, embora a discriminação por idade seja um problema crescente, muitas empresas têm buscado corrigir esse comportamento.

    Aspas da citação
    Treinamentos para recrutadores, o uso de inteligência artificial para evitar vieses inconscientes e a revisão das descrições de vagas têm sido práticas adotadas por empresas comprometidas com a diversidade
    Renata Freires CEO da RHF Talentos
    Aspas da citação

    Ela destaca que muitas empresas já estão revendo seus processos seletivos, especialmente ao notarem que a exigência de "perfil jovem" acaba afastando candidatos qualificados e comprometendo a diversidade nas equipes.

    Em resposta ao aumento da discriminação, o mercado tem se mostrado mais vigilante. "A visibilidade das práticas discriminatórias aumentou. Candidatos estão mais atentos, e a sociedade, mais crítica", observa Freires.

    Ela reforça que as empresas que ainda priorizam profissionais jovens e sem filhos estão se limitando. "Equipes diversas têm um desempenho muito melhor, combinando diferentes perspectivas e experiências. Aqueles que não mudarem, vão ficar para trás".

    Outros fatores

    Além do etarismo, a pesquisa também identificou que a falta de transparência salarial (26%), a duração ou complexidade dos processos seletivos (25%) e a ausência de feedback dos recrutadores (20%) são fatores que influenciam na decisão dos candidatos de desistir de vagas. A transparência, segundo Freires, é fundamental para atrair talentos qualificados.

    "Hoje, os candidatos querem saber quanto vão ganhar antes de entrar em um processo seletivo. E as empresas precisam entender que a falta de clareza pode ser um grande obstáculo para a contratação”, disse.

    A discriminação por idade é uma prática ilegal no Brasil

    Outros fatores como a escolha de não contratar mulheres com idade fértil, medo de licenças-maternidade e preconceitos sobre a personalidade feminina, como serem vistas como “histéricas” ou “difíceis de trabalhar”, também fazem parte da realidade das mulheres no mercado de trabalho.

    A jornalista também destacou como a maternidade impactou sua trajetória profissional. Inicialmente, não sentiu dificuldades ao ser mãe jovem, mas, com o tempo, percebeu que isso se tornava um peso no mercado de trabalho.

    "Eu fui mãe jovem, né? E não senti tanto, né? Foi mais com 21. Aí, eu não senti tanto esse peso de ser mãe no mercado de trabalho. Mas, com o passar do tempo, eu comecei a perceber que isso era um peso, né? A partir dos meus 28, 29 anos, ficou pior ainda", disse.

    O preconceito, segundo ela, se intensifica para mães em diferentes faixas etárias.

    "Então, pega uma menina de 21, 22, com bebê... Muito diferente de uma mulher de 30 e poucos com filho pequeno. Porque daí tu já é ‘uma velha que tem um filho’, entendeu?", comentou.

    Essas práticas, segundo Freires, não só prejudicam a inclusão, mas também afetam o desempenho das empresas.

    Aspas da citação
    O preconceito contra mulheres que podem engravidar ainda é muito forte. Mas as empresas precisam perceber que essas crenças são não apenas erradas, mas também prejudiciais para os negócios
    Renata Freires CEO da RHF Talentos
    Aspas da citação

    A crescente conscientização sobre os vieses discriminatórios tem levado empresas a adotar medidas para corrigir essas falhas.

    "Investir em diversidade não é apenas uma questão ética, mas também uma vantagem competitiva", afirma Freires.

    O que diz a lei

    A discriminação por idade é uma prática ilegal no Brasil. A Constituição Federal de 1988 e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) garantem que todos têm direito a trabalhar sem serem prejudicados por sua idade, gênero, raça ou qualquer outra característica pessoal.

    Porém, muitas empresas ainda adotam práticas discriminatórias, seja em seus anúncios de emprego, seja durante entrevistas. Anúncios que limitam a idade ou exigem características físicas específicas, como "boa aparência", são comuns, embora contrariem a legislação.

    O advogado trabalhista Victor Cozendey ressaltou que a Constituição Federal de 1988 garante direitos fundamentais e combate qualquer forma de discriminação, inclusive nos processos seletivos.

    Segundo ele, candidatos que enfrentam atos discriminatórios podem buscar reparação na esfera cível e criminal, além de recorrer a medidas trabalhistas para responsabilizar as empresas envolvidas.

    Aspas da citação
    A vedação existente no combate a todo e qualquer ato discriminatório, em especial aos praticados ao longo de processos seletivos, deve ser combatida em consonância com a prerrogativa maior da CF/88. Em um eventual ato discriminatório, será possibilitado ao candidato ingressar com ações legais, seja na esfera criminal e/ou cível, a fim de buscar ser reparado em sua dignidade
    Victor Cozendey Advogado
    Aspas da citação

    O advogado também destacou que a legislação brasileira possui dispositivos que reforçam a proteção contra a discriminação, como a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a Lei 9.029/95, que proíbe práticas discriminatórias na admissão ou permanência no emprego.

    “As consequências para empresas que violam o arcabouço normativo de proteção ao trabalhador/candidato passam por ações de cunho reparatório da moral, ações por dano material e ações civis públicas movidas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), além da aplicação de sanções administrativas, como multas e interdições”, explicou.

    Quanto à comprovação da discriminação em processos seletivos, Cozendey alertou que essa etapa pode ser desafiadora, mas é possível reunir evidências como e-mails, mensagens, textos, anúncios de vagas e provas testemunhais.

    Aspas da citação
    Registros de processos seletivos que deixem claro o currículo, notas de entrevistas e testes, além da comparação com candidatos com qualificações semelhantes que foram contratados, podem ser indícios significativos
    Victor Cozendey Advogado
    Aspas da citação

    Por fim, ele enfatizou a importância da denúncia formal aos órgãos competentes, como o Ministério Público do Trabalho (MPT), a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (SRTE) e a Defensoria Pública da União (DPU).

    “Cada um desses órgãos tem um papel específico, desde a investigação e denúncia até a aplicação de multas e assistência jurídica ao trabalhador”, concluiu.

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