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Resgatada de trabalho análogo à escravidão chora ao tocar em repórter: 'Receio de pegar na sua mão branca'

A pauta da entrevista era o trabalho escravo na Bahia

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Os 45 anos de escravidão vividos por Madalena Santiago Silva, hoje com 62 anos, começaram a ser compensados a partir de uma ação cautelar movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) da Bahia que garantiu o bloqueio de bens e o pagamento de um salário mínimo enquanto a ação principal tramita na Justiça do Trabalho. A decisão saiu nesta sexta-feira (29).

Dias antes, na última quarta-feira (27) um momento exibido no programa de TV Bahia Meio Dia, emissora afiliada da Globo em Salvador, comoveu os telespectadores. É que durante uma reportagem Madalena confessou à repórter Adriana Oliveira que temia pegar em sua mão por ela ser uma mulher branca. A pauta era o trabalho escravo na Bahia.

“Fico com receio de pegar na sua mão branca”, desabafou Madalena.

“Mas por quê? Tem medo de quê?”, indagou a repórter, estendendo as mãos.

“Por que ver a sua mão branca… eu pego e boto a minha em cima da sua e acho feio isso”, explicou a vítima.

“Sua mão é linda, sua cor é linda. Olhe para mim, aqui não tem diferença. O tom é diferente, mas você é mulher, eu sou mulher. Os mesmos direitos e o mesmo respeito que todo mundo tem comigo, tem que ter com você”, disse a jornalista.

Logo após, Madalena recebeu um abraço de Adriana. A cena viralizou na internet e sensibilizou milhares de pessoas.

Na ação cautelar, a procuradora Lys Sobral, coordenadora nacional de combate ao trabalho escravo do MPT, pediu que sejam bloqueados bens no valor de R$1 milhão para garantia das verbas rescisórias e dos danos morais que serão pedidos na ação principal.

A juíza titular da 2ª vara do Trabalho de Salvador, Vivianne Tanure Mateus, acolheu integralmente os argumentos e determinou o pagamento de um salário mínimo até o julgamento da ação principal e o bloqueio dos bens.

"O caso de Madalena choca qualquer pessoa pelo grau de humilhação a que a ex-empregada doméstica foi submetida. Sem nunca ter recebido salários e sem qualquer pagamento, foi expulsa há um ano pela filha dos patrões para fora da casa em que morou para passar viver à própria sorte", disse em nota o MPT.

O caso

A situação chegou ao conhecimento do MPT pela vítima, que, instruída por populares, fez denúncia na sede do órgão no fim de dezembro passado. O caso foi investigado e no início de abril o órgão ingressou com a ação cautelar.

Fragilizada emocionalmente, com baixa autoestima e com o estigma do racismo impregnado em suas palavras e ações, Madalena vive numa casa simples montada com apoio de vizinhos. Das humilhações que sofreu, fala com tristeza. E não foram poucas.

O MPT informou à reportagem que, segundo depoimento da patroa, ela foi entregue pelo pai aos 16 anos para trabalhar como doméstica em 1975. Nunca recebeu salários para ajudar a patroa e o marido, falecido em 2020, a cuidar da casa e a criar a filha única.

Antes de morrer o patrão a ajudou a dar entrada em um processo de aposentadoria por contribuições como autônoma. O dinheiro ia para uma poupança e serviu até para a compra de móveis para seu quarto no sítio em que viva a família dos patrões.

Há três anos, antes da morte do patrão, foi descoberto um desfalque nas contas deles e de Madalena, feito pela filha do casal, criada com a ajuda dela. Além disso, a filha fez uma série de empréstimos consignados em nome da então empregada. Descoberta, a filha foi confrontada pelo pai e a relação ficou complicada.

Ainda conforme o MPT, Madalena seguiu na casa, até ser expulsa no ano passado pela filha dos patrões, sem direito a levar seus pertences nem a qualquer pagamento. Desamparada e sem meios, acabou acolhida por pessoas da comunidade e orientada a procurar o órgão.

No último dia 8, o Grupo Especial de Fiscalização composto por auditores-fiscais do trabalho e com a presença de uma procuradora do MPT e de servidores da União com o apoio da Polícia Militar, encontrou Madalena vivendo na casa de um vizinho para começar a mudar sua história.

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