Cidades

Gonçalense resgata tradição de 'malhar' Judas com alerta para idosos

O boneco de 'Judas' foi colocado na Rua Alberto Coelho, no Raul Veiga. Foto: Colaboração/Matheus Merlim

A tradição de 'malhar' Judas no Sábado de Aleluia (entre a Sexta-feira Santa e domingo de Páscoa) continua viva para o católico Leonardo Bernardi, de 38 anos. Morador do bairro Raul Veiga, em São Gonçalo, o comerciante costuma pendurar o boneco, há pelo menos cinco anos, em frente à Igreja de Santa Rita de Cássia, sempre trazendo uma crítica social. Neste ano, o tema escolhido foi um alerta para idosos a respeito do novo coronavírus.

Utilizando roupas doadas por um cliente, Leonardo montou o boneco usando papelão e outros tecidos. No rosto, improvisou uma máscara. Acima do 'Judas', colocou uma placa: "Fique em casa, idoso!". A intenção, segundo o comerciante, é resgatar uma tradição de infância e trazer leveza para os dias difíceis que a população tem enfrentado.

"Quando eu era pequeno, era mais frequente as pessoas malharem o Judas no sábado. A intenção não é ser violento ou incentivar isso, mas resgatar a tradição, trazer a molecagem para os dias atuais. Precisamos manter o espírito brincalhão para conseguir enfrentar esse período", disse.

Geralmente, o tema - de acordo com o comerciante - é referente a alguma crítica social ou algum alerta. Nos último anos, o boneco já foi um 'vigia' contra assaltos na rua e, outrora, foi 'fiscal' para apontar buracos e imperfeições do asfalto na região.

"Esse ano eu decidi trazer o alerta para os idosos sobre o coronavírus. Não levei mais de duas horas para terminar de fazer o boneco e trouxe pela manhã, na hora de abrir a loja, para colocar. Muita gente parou para fotografar. É isso que eu quero, passar a tradição a frente, para as futuras gerações", explicou Leonardo.

Tradição

Chamado na crença católica como 'Sábado de Aleluia', o dia entre a Sexta-Feira Santa e o Domingo de Páscoa também carrega a tradição de 'malhar o Judas'. De acordo com o padre Luiz Otávio Gomes Gouveia, missionário do Sagrado Coração, o intervalo entre a morte de Jesus Cristo e a ressurreição deve ser o momento de solidão do indivíduo, a fim de praticar o autoconhecimento e a autocrítica.

"É o dia para pessoas olharem para dentro de si. Se você conhece a si mesmo, você tem facilidade de buscar conhecer o outro. Hoje as pessoas vivem um barulho muito grande, todo mundo está sempre fazendo muita coisa e não tem tempo para um momento individual e profundo. Não é estar sozinho, é estar consigo mesmo. O próprio Deus se coloca em solidão dessa forma para depois nascer de novo", explicou.

Ainda de acordo com o padre, o 'malhar' o Judas é uma tradição antiga em que as pessoas se libertavam para apontar as falhas dos semelhantes. Justamente porque, segundo o sacerdote, Judas é considerado o único traidor que não reconheceu a traição, diferente de Pedro que também traiu Cristo, o negando três vezes, mas conseguiu cair em si.

"Tanto a figura de Pedro quanto a de Judas traíram Jesus da mesma forma. Só que Pedro reconhece, o outro não. Na tradição antiga, malhar o Judas era mostrar que aquela pessoa tinha característica de traidor, ou seja, que não estava sendo uma pessoa que reconhece o seu erro. A ideia é de que Judas foi traído pela própria consciência. Por isso, pode ser feita uma releitura nos dias de hoje. Se a gente continuar saindo de casa, achando que o coronavírus é um exagero, vamos nos deixar trair. Você pode se trair não ouvindo os outros", reiterou o missionário.

Publicada às 19h38

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