Conduta ilícita

Ação acusa vereador de Maricá de intolerância religiosa na internet

MP quer retirada de vídeo das redes sociais e retratação pública

MP ressalta que, em caso de descumprimento, o parlamentar será multado
MP ressalta que, em caso de descumprimento, o parlamentar será multado |  Foto: Reprodução

A Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva de Maricá ajuizou, nesta terça-feira (14), ação civil pública (ACP) contra o vereador de Maricá Ricardo Magalhães Garcia Gutierrez, conhecido como Ricardinho Netuno, por intolerância religiosa, por divulgar vídeo nas redes sociais contendo mensagem que difunde medo e ódio às religiões de matrizes africanas.

Na ACP, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) requer em tutela de urgência que o parlamentar seja obrigado a retirar o vídeo das suas redes sociais e a se retratar publicamente.

O MP informou ainda que, em reunião realizada na segunda (13), com a promotora de Justiça Marcela do Amaral, o parlamentar foi alertado a respeito da sua conduta ilícita ao veicular intolerância religiosa e fomentar o medo em face das religiões de matriz africana, mas se recusou a remover o vídeo e a firmar compromisso de ajustamento de conduta com o MP.

Diante da necessidade do ajuizamento da ação, o MP requer que o Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Maricá determine a retirada do vídeo das redes sociais no prazo de 24 horas. Requer ainda que, no prazo de 10 dias, o vereador providencie a retratação mediante gravação de vídeo com duração semelhante, veiculado em suas redes sociais, pelo período de 30 dias, bem como nas páginas oficiais de suas redes sociais (Instagram, Facebook e Twitter) pelo mesmo período.

Entre os pedidos, o MP ressalta que, em caso de omissão no cumprimento da decisão que determina a remoção da postagem, que o parlamentar seja multado no valor de R$ 200 mil. Na hipótese de descumprimento da decisão judicial, que seja determinada a remoção do conteúdo à empresa Meta, responsável pelo Instagram.

'Macumba' nas escolas

O vídeo, postado em 17 de janeiro de 2024, traz diversas frases, como: "A Prefeitura de Maricá está ensinando 'macumba' às crianças em cursos e escolas municipais'. Em outro momento do vídeo, bonecas africanas, produzidas em uma oficina de arte, são chamadas de vudus.

O vídeo finaliza com a mensagem: “Quando seu filho for possuído, você saberá de quem é a culpa”. A publicação também mostra a imagem de um homem negro, com os olhos arregalados e boca aberta, de onde escorre um líquido vermelho e surge o símbolo do Partidos dos Trabalhadores, velas acesas e fagulhas.

Na ACP, a promotora de Justiça ressalta que “ao afirmar que crianças e adolescentes estão em risco, esse tipo de mídia explora o racismo estrutural e aumenta a sensação de insegurança e medo diante daquilo que não se conhece e, por consequência, estimula a segregação e justifica a prática de violências físicas e psicológicas, o que aumenta a vulnerabilidade vivenciada por esse grupo”.

O que diz o vereador

Contactado para comentar o assunto, o vereador Ricardinho Netuno citou o artigo 19, da Constituição Federal, onde diz que "é vedado a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-las, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes, relações de dependência ou aliança, ressalvada na forma da lei, a colaboração de interesse público".

Em nota, ele também abordou o inciso VIII do artigo 29, também da Constituição Federal, que "preconiza a inviolabilidade dos Vereadores por suas opiniões, palavras e votos no exercício do seu mandato e na circunscrição do Município".

"Por arremate, consta no inciso VI do artigo 5º da nossa Lei maior que: é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias", continuou o vereador Ricardinho Netuno.

Ainda de acordo com o parlamentar, com efeito, em harmonia com o artigo 227, também da Constituição Federal:

"Vislumbramos que é dever da família, da sociedade e do Estado, assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito a dignidade, o respeito e a liberdade, atribuindo exclusivamente aos pais o dever de assistir, criar e educar os seus filhos menores, conforme assegura o artigo 229 da Carta Magna de vigência".

Ricardinho Netuno pontua que, "diante destas garantias constitucionais de grandeza monumental, restam fincadas três pilares que nenhum pai consciente jamais abriria mão de exercitar, são elas: a Liberdade de Consciência, de Crença e de Proteção e Cuidado com os seus filhos menores".

Ele ressalta, ainda, que no episódio do compartilhamento do vídeo em suas redes sociais, "deu-se conta que a Secretaria de Educação, sob pretexto de levar cultura para estudantes da rede pública e particular, utiliza das suas estruturas governamentais espalhadas por todo território do município para, sorrateiramente, incentivar práticas de iniciação religiosas as nossas crianças e adolescentes que fazem alusão as cerimonias litúrgicas de matriz afrodescendentes, haja vista não ter parte teórica a ser ensinada".

Em nota, Ricardinho Netuno diz que "embora eu mesmo, tenho minha origem familiar fincada nas religiões voltadas aos ritos da umbanda e de candomblé, em função da minha mãe e avós vivenciarem estas práticas; porém, em respeito a Constituição Federal e ao Direito Administrativo, achei por bem dividir com a sociedade maricaense o que está ocorrendo nas oficinas promovidas pela Secretaria de Cultura".

Netuno pontua que como vereador de mandato, tem dever e prerrogativas para fiscalizar e cobrar.

"E alertar aos pais o riscos de vulnerabilidades de sofrerem os seus filhos fortes influências destas práticas religiosas celebradas de forma velada e vexatórias para quem não está inclinado a participar de tais 'oficinas culturais', acha vista que podem violar direitos de consciência e que assegura aos pais e filhos fazerem as suas respectivas objeções constitucionais, já que ninguém é obrigada a fazer ou deixar de fazer senão em virtude de lei".

Por fim, o parlamentar comenta que "nenhuma lei municipal ou federal, poderá retirar dos pais estes direitos naturais de educar e orientar com exclusividade a moral e religiosidades dos seus filhos".

"É justamente por isso que recursei a proposta do Ministério Público que partindo de uma premissa falsa de que teria eu incorrido em ilicitude contra grupos étnicos ou religiosos por compartilhar o vídeo, buscava na verdade que eu abdicasse das minhas funções constitucionais de vereador e assumisse uma culpa que não existe; exigindo inclusive que pagasse uma indenização sem que sequer tivesse eu lesado qualquer bem jurídico ou pessoas", finaliza.

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