Herói

Entregador que evitou ataque na Irlanda vira orgulho de Niterói

Caio Benício diz que vem recebendo carinho na ruas da cidade

Caio usou um capacete para impedir um ataque em uma escola na Irlanda
Caio usou um capacete para impedir um ataque em uma escola na Irlanda |  Foto: Péricles Cutrim

Alguns roteiros da vida real ultrapassam qualquer imaginário dos filmes de ação. Em Niterói, na Região Metropolitana do Rio, por exemplo, um entregador virou símbolo de heroísmo da cidade por um ato tão genuíno em Dublin, na Irlanda.

Caio Benício, de 43 anos, evitou um ataque e salvou a vida de uma professora e uma criança de 5 anos, na porta de uma escola. 

No dia 23 de novembro, Caio deixou a adrenalina tomar conta do corpo ao passar de moto em frente à unidade de ensino e ver um homem esfaqueando crianças e civis na calçada.

No impulso de cessar o ataque, ele tirou o capacete da cabeça e desferiu golpes no suspeito, que caiu no chão.

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"Era um dia normal, como qualquer outro, tinha bastante gente na rua, hora do almoço. Eu vi uma confusão, me chamou atenção que era uma mulher envolvida, eu diminuí minha moto e quando passei bem perto eu vi que eles estavam lutando por uma menininha, e o cara puxou ela dos braços dela [professora]", relembra. 

Menina de 5 anos que foi salva ainda segue lutando pela vida no hospital

Naquele momento, Caio conta que a professora estava ferida e, mesmo assim, lutava para defender a criança. Ele chegou a ver, com clareza, os golpes que o agressor desferia na pequena, sem parar. 

Quando eu vi que ele tinha uma faca, com uma menininha tão pequena nos braços, eu não tive nem tempo de escolha, foi no instinto mesmo, joguei a moto no chão e fui para cima, meu objetivo era fazer ele parar de esfaquear ela. Eu tirei o capacete e usei como uma arma para agredir ele Caio Benício, entregador

Segundo o entregador, a menina que foi salva ainda segue lutando pela vida no hospital. A mãe e o pai chegaram a encontrar com Caio e agradecê-lo pelo ato. 

"Começa a surgir boatos de que a menina tinha falecido, então eu comecei a me sentir muito mal com essa história, todo mundo me parabenizando como herói e ela lutando pela vida dela. Então eu decidi fazer uma visita, os pais pediram para eu subir e eles foram super gratos", ele diz ainda que ofereceu suporte financeiro com as despesas do hospital, mas a família recusou.

Noites sem dormir

"Primeiro, você fica em estado de choque, eu recuei e fui ver o estado dela [criança], para mim ela estar viva hoje é um milagre, você fica em estado de choque. Depois você vê os pais chegando, desesperados. Tomei um calmante". Os relatos vão ficar marcados na memória de Caio.

Naquela noite, ao voltar para casa depois de prestar depoimento na delegacia, a ficha do entregador começou a cair.

"Vai caindo aos poucos, não consegui dormir as duas noites seguidas, a mão não parava de tremer, você fica com aquela imagem na cabeça, começa a se contestar: e se eu tivesse ido mais rápido? Muita gente me chamando de herói, mas eu não me considero herói", desabafa.

Do empresário ao imigrante

Barkana pegou fogo em novembro de 2019
Barkana pegou fogo em novembro de 2019 |  Foto: Reprodução

Uma coisa que ganhou destaque na Irlanda foi o fato do agressor não ser natural do país. Mas, por morar lá há muito tempo, conseguiu adquirir a cidadania irlandesa. Após o ataque, muitos protestos pedindo a retirada de imigrantes aconteceram.

O curioso é que o Caio é imigrante, e quando a notícia se consolidou por lá, as coisas deram uma acalmada. Ser recepcionado pelo primeiro-ministro Leo Varadkar também reforçou o recado de que o problema não está no fato de pertencer a outro país. 

Quando sai nos jornais, no dia seguinte, de que foi um outro imigrante que ajudou, tirou a legitimidade daquele protesto, que acabou virando vandalismo. Você ser recebido pelo primeiro-ministro com toda essa situação política que estava vivendo o país, foi uma responsabilidade enorme Caio Benício, entregador

Caio mora em Icaraí, na Zona Sul de Niterói. Ele era dono de um famoso restaurante na cidade, o Barkana, que pegou fogo em novembro de 2019. E se mudou para Irlanda na busca de tentar uma vida melhor, e se dividia em trabalhar lá como motoboy e visitar a família no Brasil. 

"Eu tinha um seguro que só cobria reforma. Comecei a acumular dívidas, foi difícil me reerguer, era um negócio que eu amava. Eu entrei em depressão. Depois de um ano eu conversei com a minha esposa e decidi ir para Dublin, trabalhava de delivery pela flexibilidade, minha família ficou por conta da escola dos meus filhos, uma maneira provisória que a gente encontrou", detalha.

Vaquinha de R$ 2 milhões

O entregador foi abraçado pelo povo irlandês, que fez até uma vaquinha online intitulada 'Pague uma cerveja para Caio'. O valor arrecadado chegou a R$ 2 milhões.  

De volta ao lar

Imagem ilustrativa da imagem Entregador que evitou ataque na Irlanda vira orgulho de Niterói
|  Foto: Redes Sociais

Destaque internacional, capas de jornais mundiais, diversas entrevistas. A vida do Caio virou de cabeça para baixo da noite para o dia. Mas uma coisa ainda pesava no coração do niteroiense: a saudade da família.

No dia 15 deste mês, o herói da Irlanda, voltou para os braços das suas maiores inspirações: a esposa Clara, a filha Lara e o caçula Breno. 

"É maravilhoso! Você estar no seu lugar, com seus filhos, proporcionar orgulho para os filhos, familiares, amigos. Eu passo na rua, o pessoal querendo me abraçar, por orgulho. Receber esse carinho é demais", enfatiza.

O futuro ainda é incerto, mas para o herói da Irlanda, de Niterói e do mundo, fica a certeza de que, por mais turbulenta que seja a viagem, o que importa é quem te espera na linha de chegada. 

"Muita coisa está acontecendo, a Irlanda está no meu coração, toda história da vaquinha com mais de quatro mil pessoas me abraçaram. Seria muita ingratidão eu virar as costas para um país que me abraçou dessa forma. Minha família queria que eu voltasse, mas eu pretendo ficar indo e voltando", finaliza. 

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