Remissão
Vida após o câncer: uma história de superação e desafios em Niterói
Professora de 47 anos inspira mulheres e prepara livro
Em remissão do câncer de mama, a professora Carini Pereira Nóbrega, de 47 anos, que mora no bairro Fonseca, na Zona Norte de Niterói, utiliza o diagnóstico da doença, considerada agressiva, para ajudar e influenciar mulheres da cidade com sua história de superação e as lutas que enfrentou no período de tratamento, onde precisou até mesmo raspar o cabelo.
Com um sorriso no rosto e a cabeça erguida, ela se considera vitoriosa e um verdadeiro milagre e começou a ser convidada para dar palestras e influenciar outras pessoas, além de ser reconhecida em eventos como uma mulher inspiradora.
O que as pessoas mistificam sobre o câncer é: 'eu tenho câncer, então vou morrer'. Mas não é assim. Eu aprendi a lutar e a viver
Atualmente, ela está na fila do Sistema Nacional de Regulação (SISREG) aguardando a cirurgia plástica de reconstrução de mama.
Carini realiza os exames de rotina e permanece em observação, porém, não foi detectada nenhuma célula cancerígena.
Diagnóstico
A professora descobriu a doença em 2022. Ela conta que não possuía muitas informações sobre o câncer. “Foi um choque para mim. O que eu sabia vinha das campanhas de prevenção, que falam sobre a importância do autoexame e dos exames de rotina”, relatou.
Carini foi diagnosticada com carcinoma triplo negativo (CTN), um tipo de câncer considerado agressivo devido ao seu rápido crescimento e à maior chance de disseminação no momento do diagnóstico.
Ela conta que ficou profundamente abalada ao descobrir a doença, especialmente porque seus exames de mamografia e ultrassonografia de mama, realizados regularmente, não haviam detectado o câncer.
Até então, seus últimos exames foram feitos em 2021, durante a pandemia, quando muitos postos de saúde estavam fechados e houve atrasos na entrega dos resultados.
Embora tivesse dificuldade em acessar os exames, ela realizava o autoexame, mas, sem a devida orientação, não percebia alterações. “Eu não sentia nenhum caroço, não sentia nada”, explicou."
Tratamento
No entanto, seu corpo dava sinais de alerta, como um cansaço extremo ao realizar tarefas simples do dia a dia. Carini destacou que, no ano seguinte, antes de receber o diagnóstico, ela passou mal e teve síncope (desmaio) durante um evento em sua igreja. O câncer já estava em estágio avançado.
Para ela, o episódio foi determinante, pois recebeu atendimento imediato de duas enfermeiras presentes no local. "Se eu tivesse passado mal em casa, não teria recebido o atendimento rápido que tive e algo pior poderia ter acontecido ", explicou.
A doença já havia se espalhado pelo corpo da professora, atingindo diversas áreas. Segundo o médico que a atendeu inicialmente, essa foi a maneira que o corpo encontrou para emitir um sinal de alerta. O câncer estava localizado em uma região que os exames de rotina não conseguiam detectar.
"Poderia ter sido fatal, mais grave do que eu jamais imaginei", relatou.
No início, Carini ficou internada por dez dias no Hospital Municipal Oceânico Dr. Gilson Cantarino, em Piratininga. Após receber alta, foi encaminhada para a Policlínica de Especialidades em Atenção à Saúde da Mulher Malu Sampaio, no Centro da cidade, onde realizou uma biópsia que confirmou o diagnóstico positivo para câncer.
Medo
A professora relata que, ao ser informada pelos médicos sobre a necessidade de uma mastectomia total, sentiu um grande medo.
"Foi nesse momento que a ficha caiu e percebi a gravidade da situação", confessou. "Foi muita informação de uma vez só e, de repente, eu não estava conseguindo absorver nem compreender o que estava acontecendo", explicou. Para a professora, a cirurgia parecia ser apenas mais uma operação comum.
Cirurgia
Após exames e orientações médicas, a professora precisou passar pela cirurgia, pois o nódulo que havia sido detectado começou a crescer rapidamente.
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A cirurgia foi complexa e incluiu o esvaziamento da axila para isolar os linfonodos sentinela. "A cirurgia foi um sucesso, fiz em um dia e no dia seguinte voltei para casa. A recuperação foi boa", explicou ela.
Tratamento
Para Carini, a cirurgia parecia ser o fim do processo, e ela acreditava que não precisaria realizar mais nada. No entanto, ainda havia tratamentos prolongados a serem feitos após o diagnóstico de câncer. Ela passou por quatro sessões de quimioterapia vermelha e quatro de quimioterapia branca, realizadas de forma intensiva para bloquear o crescimento das células cancerígenas.
Quando realizou a quimioterapia branca, ela teve uma reação e sofreu uma embolia pulmonar, precisando ficar internada por vinte e cinco dias. “Eu saí da UTI direto para casa. Eu me considero um milagre", disse.
A partir do momento em que ela realizava o tratamento, isso animava a professora e, com isso, ela dava força a outras pessoas.
Para Carini, ter um grupo de apoio formado por familiares, amigos e membros da igreja foi fundamental para sua evolução no tratamento. "Eu recebi todo apoio que eu precisava", relembra.
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Índice no Brasil
De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), até 2025, estima-se que 73.610 novos diagnósticos de câncer de mama sejam feitos, com uma incidência de 66,54 casos por 100 mil mulheres, além de cerca de 18 mil mortes previstas. Embora seja raro, o câncer de mama também pode afetar homens, representando aproximadamente 1% dos casos.
O câncer de mama é o tipo de câncer que mais causa mortes entre as mulheres no Brasil. Em 2021, a taxa de mortalidade ajustada por idade, baseada na população mundial, foi de 11,71 a cada 100 mil, resultando em 18.139 óbitos.
Segundo um estudo relacionado pelo INCA neste ano, no Brasil, foram estimados 73.610 casos novos de câncer de mama em 2024. A estimativa de risco é de 66,54 casos a cada 100 mil mulheres. Apenas cerca de 1% dos casos ocorre em homens.
O câncer de mama é o tipo de neoplasia mais comum entre as mulheres no Brasil, com as regiões Sul e Sudeste registrando as maiores taxas de incidência e mortalidade. Diante desses números, a importância da detecção precoce e da prevenção primária se destaca como fator crucial para a redução dos casos.
O acesso à informação, a realização de exames de rotina e o cuidado contínuo com a saúde são fundamentais para que as mulheres estejam aptas a reconhecer os sinais da doença e busquem tratamento adequado o mais rápido possível.
"Aprendi a me amar como mulher"
Após chegar em casa depois da cirurgia, Carini relatou ter passado por um momento de choque. Com o curativo ainda cobrindo a área operada, ela não tinha plena consciência de como o procedimento havia sido realizado. O momento mais impactante ocorreu quando foi tomar banho pela primeira vez. “Quando me vi, não foi meu corpo que reagiu, mas sim meu emocional, pois eu não estava preparada para aquilo.”
Ela conta que o choque foi tão intenso que sentiu o braço paralisado, desenvolvendo um medo de movimentar o braço direito. Para superar essa dificuldade, foi necessário passar por sessões de fisioterapia.
Carini também compartilha que, logo após a cirurgia, teve dificuldade em se enxergar como mulher por conta da ausência de parte de sua mama. Com o tempo, à medida que avançava nos tratamentos e aceitava o processo, ela passou a se reconectar consigo mesma e a recuperar a confiança.
Rede de apoio
Para ajudar na recuperação da autoestima, a professora começou a frequentar a Associação dos Amigos da Mama (Adama) que a ajudou a cuidar do emocional e a Policlínica de Especialidades em Atenção à Saúde da Mulher Malu Sampaio, onde ela recebeu uma prótese móvel para utilizar no sutiã, o que a ajudou a se sentir mais confortável em público.
Ela relata que, antes de ter a prótese, os olhares de julgamento e curiosidade das pessoas a incomodavam. “Antes da prótese, ficava liso, e as pessoas olhavam, era um susto para elas, e isso me incomodava.”
Com a prótese, Carini começou a se amar novamente. “Passei a me arrumar, a sair de casa para outras coisas além de ir ao médico. Antes, eu evitava sair por causa dos olhares.” O suporte psicológico oferecido pela equipe da policlínica também foi essencial para a recuperação de sua autoestima.
Adama
A Adama, grupo que Carini participa até hoje, foi fundamental em sua vida, proporcionando apoio e fortalecimento. Com participação gratuita, a associação auxilia pessoas diagnosticadas com câncer de mama, oferecendo suporte emocional, informações e, em alguns casos, assistência para tratamentos.
Segundo a fundadora, Dra. Thereza Cypreste, a associação foi criada em 1996, portanto, há 28 anos. “O objetivo principal da Adama é funcionar como um grupo de apoio, onde as participantes podem se reunir, trocar experiências e oferecer suporte umas às outras.”
A associação é mantida por uma equipe de voluntários, que inclui médicos, enfermeiros, psicólogos, advogados e entre outros profissionais.
“Temos uma equipe com 15 voluntários atualmente, incluindo três psicólogas, um escritório de advocacia, duas fisioterapeutas, uma nutricionista e uma aromaterapeuta”, explica Thereza.
Em encontros com grupos de 20 a 25 mulheres, há trocas de experiências, conversas de apoio e encorajamento. “Elas compartilham suas vivências. Uma coisa é alguém de fora dizer que a cirurgia não vai doer; outra é ouvir isso de quem já passou pelo mesmo processo, que realmente entende”, acrescenta Thereza.
As reuniões acontecem presencialmente todas as quartas-feiras, das 7h às 11h, na Rua Visconde do Uruguai, número 531, no Edifício Arariboia, Centro de Niterói. Vale ressaltar que a participação é gratuita.
Superação
"Eu me considero curada", afirma Carini Pereira Nóbrega, de 47 anos. Ela não tinha firmeza nas mãos por conta dos tratamentos, mas hoje consegue pegar copos por exemplo e realizar tarefas básicas, algo que antes não conseguia.
Para a professora, o câncer não é um ponto final.
"Eu aprendi que o câncer tem tratamento, e esse tratamento deve ser adequado, propício e de acordo com o tipo de câncer que você tem, visando a sua sobrevida. Eu dizia todos os dias: 'Esse câncer não vai me vencer'", relembra.
Vida regrada
Devido à perda de movimentação nos braços, ela atualmente utiliza um cateter para ajudar nas suas atividades, e sua rotina foi transformada. Ela leva uma vida mais regrada, com uma rotina de exercícios físicos, cuidados com a alimentação e com o sono, além de realizar fisioterapia.
Como forma de recordar e lembrar da superação dessa fase, a professora possui uma cicatriz que vai da metade do peito direito até as costas.
A professora está desenvolvendo um livro contando sua história para inspirar mais mulheres que foram diagnosticadas.
Estou vivendo um dia de cada vez, mas entendendo que eu sou uma vitoriosa
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