Entrevista

Secretário sobre situação das ruas de Niterói: 'Realidade do país'

Elton Teixeira falou sobre pessoas em situação de rua

Segundo secretário, dados do CadÚnico da cidade apontam para aumento de cadastrados entre 2018 e 2023
Segundo secretário, dados do CadÚnico da cidade apontam para aumento de cadastrados entre 2018 e 2023 |  Foto: Enfoco

À frente da secretaria de Assistência Social e Economia Solidária, o servidor público e mestre em Ciência Sociais pela UFRRJ, Elton Teixeira, sabe que o desafio  em relação aos moradores em situação de rua no município de Niterói é grande.

O chefe da pasta revela em entrevista exclusiva ao ENFOCO que não é possível quantificar as pessoas em condições de vulnerabilidade, mas atesta um aumento. Em 2018, 301 pessoas estavam cadastradas no CadÚnico na cidade, frente a 759 este ano. Os dados não são, necessariamente, uma confirmação do aumento referente a esta parcela da população que vivem na cidade. 

Segundo Elton, a realidade de pessoas perambulando por ruas da cidade não é um caso somente de Niterói. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), houve aumento de 38% em todo o Brasil, entre os anos de 2019 e 2022, o que pode ser considerado um reflexo do período mais crítico da pandemia. 

Teixeira também citou os números do programa de transferência de renda permanente, que beneficia mais de 90 mil pessoas com um investimento mensal de R$ 16,5 milhões.

ENFOCO - Moradores da cidade de Niterói citam aumento de pessoas em situação de rua, principalmente em vias do Centro e de Icaraí, na Zona Sul da cidade. Isso é verdade?

ELTON TEIXEIRA - Não é possível fazer essa afirmação, pois não há Censo de população em situação de rua de Niterói. O que podemos afirmar é que, em 2018, 301 pessoas em situação de rua estavam cadastradas no CadÚnico na cidade. Até o momento, em 2023, temos 759.

ENFOCO - Com base nas ações realizadas pela SMASES, nos últimos tempos, a pasta poderia revelar um comparativo de aumento ou diminuição desse público nas ruas, entre janeiro/outubro de 2022 e o mesmo período deste ano?

ELTON TEIXEIRA - Novamente, usando os dados do CadÚnico, em 2022 Niterói tinha 744 pessoas em situação de rua inscritas no sistema. Até o momento neste ano, a cidade tem 15 pessoas a mais inscritas.

Em caso de aumento, o município considera que há falha em algum ponto? Por que isso acontece?

Uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) informa que a população em situação de rua no Brasil cresceu 38% entre 2019 e 2022, quando atingiu 281.472 pessoas. A estimativa revela o impacto da pandemia de Covid-19 nesse segmento populacional. Não é uma realidade de Niterói, mas do país inteiro. No caso da nossa cidade, avançamos e fomos muito premiados. Como forma de diminuir a desigualdade social da cidade, a Prefeitura de Niterói lançou a Moeda Social Arariboia, programa de transferência de renda permanente, que beneficia mais de 90 mil pessoas com um investimento mensal de R$ 16,5 milhões. O programa busca ampliar a geração de novos empregos e aumentar a renda dos comerciantes, empreendedores e prestadores de serviços cadastrados por toda a cidade. Já foram efetuadas aproximadamente 2,750 milhões de transações comerciais em Arariboia. O desenvolvimento social das comunidades é outro papel que as moedas sociais cumprem que permite a criação de um mercado complementar com a possibilidade de se produzir e consumir dentro de um bairro ou município.

Pessoas em situação de vulnerabillidade social em NIterói: ajuda
Pessoas em situação de vulnerabillidade social em NIterói: ajuda |  Foto: Enfoco

ENFOCO - A pasta entende que apenas recolher os utensílios deixados nas calçadas e imóveis abandonados, como nas últimas ações, é paliativo?

ELTON TEIXEIRA - As ações de zeladoria envolvem muito mais do que o recolhimento de utensílios. A Assistência Social trabalha na sensibilização e convencimento da população em situação de vulnerabilidade social, já que a legislação brasileira não permite o acolhimento compulsório. É importante que fique claro que essa população recebe, como lhe é de direito, todo o apoio e respeito durante todo o processo. Além da sensibilização, as equipes trabalham com foco na organização do espaço urbano onde esses cidadãos estão alojados. Desde o último dia 19 [outubro] até o momento, as equipes da Prefeitura intensificaram as ações de abordagem social especializada nos bairros de maior demanda, como Centro, Icaraí e São Francisco. Ao todo, 65 pessoas foram abordadas e 14 aceitaram o acolhimento e foram encaminhadas aos abrigos. Em 2022, foram realizadas 5.464 abordagens nas ruas de Niterói, com uma média mensal aproximada de 455 ações. Até setembro de 2023, já foram realizadas 5.117 abordagens, o que dá uma média de 731 ações mensais. As ações contam com equipes da Secretaria Municipal de Assistência Social e Economia Solidária (SMASES), da Companhia de Limpeza de Niterói (Clin), da Secretaria de Conservação e Serviços Públicos (Seconser), da Guarda Municipal, da Guarda Civil Municipal, da Secretaria de Saúde, da FeSaúde (grupo de Redução de Danos) e apoio operacional da NitTrans.

Ao mesmo tempo, o Serviço Especializado de Abordagem Social é contínuo e acontece rotineiramente no dia-a-dia dos agentes da Assistência Social, compostas por assistentes sociais e técnicos. As equipes fazem rondas nos locais de maior fluxo de pessoas em situação de rua com o objetivo de oferecer acolhida e os serviços socioassistenciais à população vulnerável que ficam por diversas regiões da cidade. A Secretaria atua de forma ininterrupta. Os técnicos da abordagem social fazem o cadastro para os benefícios socioassistenciais, verificam a necessidade de segunda via de documentação e também encaminham as pessoas para os centros de acolhimento municipais.

ENFOCO - Pesquisa do Instituto de Segurança Pública (ISP) mostra que foram 331 casos de furtos a mais dentro das áreas de atuação do 12º BPM (Niterói), de janeiro a agosto de 2023, na comparação com igual período de 2022. De 4.964 saltou para 5.295 registros. Uma alta de 6,7%. A pasta concorda com a avaliação da polícia e de vítimas em atrelar alta de furtos ao público em situação de rua?

ELTON TEIXEIRA - Aqui é importante deixar claro que o trabalho da Secretaria de Assistência Social é o de garantir a proteção social dos cidadãos, principalmente os mais vulneráveis. É preciso ter muito cuidado nesta comparação. Para nós, para cada nome, para cada pessoa que está naquela situação, vivendo na rua, há um rosto, um nome, uma história de maneira geral atravessada pelo preconceito, pela vulnerabilidade social e econômica, com vínculos familiares interrompidos ou fragilizados, vícios, abusos e violência. Nosso trabalho é reunir projetos e formas de retirar essas pessoas da rua com dignidade.

ENFOCO - A lei não permite a retirada compulsória do cidadão em situação de rua. No entanto, o município de Niterói, por meio da Procuradoria-Geral do Município, leva a demanda ao Ministério Público e demais vias judiciais, para tentativas de possíveis mudanças desse contexto, ainda mais se falando em crimes?

ELTON TEIXEIRA - Repito aqui a resposta que dei anteriormente e acrescento que esta é uma lei federal. A Prefeitura de Niterói tem investido em políticas de Assistência Social para melhor atender a população em situação de rua na cidade. Só neste ano, foram investidos mais de R$ 160 milhões em políticas de assistência social. São cerca de 37 mil famílias contempladas no programa que foram selecionadas através do recorte de renda, na faixa de pobreza e extrema pobreza, conforme as regras do Programa Bolsa Família, do Governo Federal.

O Restaurante Cidadão Jorge Amado, localizado na região central de Niterói, fornece cerca de 2 mil refeições diariamente a um público variado. Uma pesquisa realizada com frequentadores, em 2021, revela que 40,2% dos frequentadores estão desempregados e que 47,7% dos frequentadores são moradores de outros municípios, sendo 31,8% de São Gonçalo, 4,7% da cidade do Rio de Janeiro, 3,7% de Itaboraí e 3,7% também de Maricá.

Desde 2017, após ser fechado pelo Governo do Estado, o equipamento passou a ser administrado pela Prefeitura de Niterói que faz um investimento anual da ordem de R$ 3 milhões. De lá para cá, todos os meses são mais de 35 mil pratos servidos que alimentam, diariamente, milhares de pessoas.

Assim como a unidade do Centro, o restaurante do Fonseca será aberto neste próximo mês à população e será uma opção de alimentação de qualidade a preços simbólicos: R$ 2 no almoço e R$ 0,50 no café da manhã. O cardápio será variado e preparado por nutricionistas.

Niterói possui uma rede de atendimento para população em situação de rua que conta com equipes de abordagem social especializada, Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro Pop) e cinco unidades de acolhimento (abrigos). Nas unidades de acolhimento, as pessoas recebem atendimento de assistentes sociais, psicólogos e orientação jurídica, encaminhamento para serviços de saúde, trabalho e renda e documentação civil. O objetivo principal é construir com os acolhidos um trabalho que culmine na sua autonomia e reinserção social. A organização desses serviços garante privacidade, o respeito aos costumes, às tradições e à diversidade de ciclos de vida, arranjos familiares, raça/etnia, religião, gênero e orientação sexual.

A Secretaria também oferece o programa de recambiamento, que permite que a pessoa em situação de rua resgate vínculos comunitários e familiares com sua terra natal e custeie o retorno ao seu estado de origem. O Centro Pop fica na Rua Coronel Gomes Machado, 259 – Centro. Enfim, essas sim são políticas públicas voltadas para a Assistência Social.

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