Dia das Mães

Mãe de adolescente atropelado na Barra dá lição de amor ao próximo

Ela viu seu filho ser atropelado pelo modelo Bruno Krupp

Mariana Cardim relembrou o ocorrido e contou sobre os quase 10 meses que vive sem o filho
Mariana Cardim relembrou o ocorrido e contou sobre os quase 10 meses que vive sem o filho |  Foto: Marcelo Tavares
 

Comemorado neste domingo (14), o Dia das Mães se tornou mais dolorido para a analista administrativa júnior Mariana Cardim de Lima, de 40 anos. É que esse é o primeiro ano que ela passa sem seu filho João Gabriel Cardim Guimarães.

O estudante foi morto aos 16 anos após ser atropelado pelo modelo Bruno Krupp, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio, no dia 30 de julho do ano passado. 

Em uma conversa exclusiva com o ENFOCO, Mariana relembrou como foi o momento do ocorrido para ela, contou sobre como era seu filho e, acima de tudo, deu uma lição de amor ao próximo e sobre ser mãe. 

No domingo de Dia das Mães, Mariana pretende ficar com sua família, especialmente sua mãe, que morava com ela e com João Gabriel em um sobrado em Realengo, na Zona Oeste do Rio. 

"Eu vou ficar com minha mãe e minha família, vamos ficar juntas, com minhas tias, acredito que não vai ser fácil. O Dia das Mães era um dia que o João se desdobrava para fazer surpresas e me agradar, mas eu vou escolher nesse dia, se eu conseguir, ficar com tudo de bom que eu vivi com ele e não com a ausência", disse ela. 

Segundo a analista, a morte de seu filho tirou um pedaço dela. Mariana precisou renascer, de uma outra forma, no momento em que soube da morte do adolescente. Ela e João Gabriel eram muito amigos, além de mãe e filho. Ele era o único filho dela.

Depois do acidente, Mariana teve que lidar com a ausência do rapaz no aniversário dele, que é em dezembro, e no aniversário dela, em fevereiro, além das festas de Natal e Ano Novo. Apesar do apoio da família, ela sabe que seu Dia das Mães nunca mais será o mesmo.

"No Dia das Mães e no meu aniversário, o João fazia de tudo para me agradar. Era café da manhã, cartinha, ele se desdobrava para ser um dia especial e ele conseguiu, me fez muito feliz durante toda a minha vida com ele, os 16 anos. O João ressignificou a minha vida, ele me trouxe a maternidade, me fez ser mãe e, melhor ainda, me fez ser mãe dele. Foi um prazer conviver com ele, foi mágico, encantador, parecia assim realmente um sonho e sonhos não duram para sempre, talvez por isso Deus tenha chamado ele tão cedo. Ele era um garoto dotado de muito amor e carinho, era especial, um presente!", contou ela. 

"Ele era meu orgulho, tenho um orgulho sem tamanho de ser a mãe dele", disse ela.

Dentre viagens, filmes de cinema e séries que Mariana e João viam juntos, o que fica é o orgulho da mãe que cuidava de um menino engraçado e que sempre demonstrava amor ao próximo. 

"O João era engraçado, a gente junto gostava de ver filmes da Disney, maratonar séries e a gente sempre conversava sobre as mensagens dos filmes e ele ia, as vezes, mais além na mensagem do que eu, ele percebia coisas que eu não percebia. Ele era carinhoso, brincávamos, fazíamos palhaçada, a gente se curtia, amávamos a companhia um do outro. Ele me olhava com admiração e eu tenho muita admiração por ele. Era um menino bom, pacífico e que vivia dizendo que me amava", relembrou ela. 

As principais lembranças de Mariana incluem ela e o filho no cinema, os amigos de João reunidos na sala dela com ele, comendo e brincando, dentre outras. Mãe e filho tinham o sonho de conhecer o parque da Disney, que fica nos Estados Unidos, juntos.

"Não deu tempo, mas, eu ainda devo ir e prestigiar ele. Toda minha relação com ele foi baseada em respeito e educação ao próximo. Ele tinha muito amor para dar, ele era intenso, dedicado e muito feliz. Ele ria o tempo todo. Adorava dar sustos, tinha um bom coração", disse ela. 

Mariana lembra de duas viagens marcantes dentre tantas com o filho: uma quando ele tinha 12 anos para o Beto Carrero e outra quando os dois foram para Gramado, no Rio Grande do Sul, um ano antes do acidente.

"Andamos na Maria Fumaça, vimos o pessoal fazendo show dentro do veículo e cantando a música Bella Ciao, que ele reconheceu como sendo da série La Casa de Papel. Ele amou a viagem, conhecemos muitos lugares, foi uma viagem maravilhosa. Eu lembro que queria comer um fondue em Gramado e ele não gostava disso, mas, eu, como mãe, fui com ele comer um hambúrguer, que era o que ele gostava. Fomos na Fonte do Amor Eterno que representa o amor que eu tenho pelo meu filho e meu filho por mim", afirmou.

João era um menino que tinha vontade de trabalhar com tecnologia da informação e fazia um curso de design gráfico e de desenvolvedor de jogos digitais. 

"Ele queria, uma vez, um jogo de RPG e ele tinha um dinheiro que ele ganhou e quase dava para comprar o jogo, mas eu ia inteirar. Eu perguntei se valia a pena mesmo para ele gastar o dinheiro com isso ou se ele não poderia criar o jogo e assim poderia ser um sucesso e, talvez, o marco da profissão dele. O João gostou da ideia, compramos soldadinhos de plástico e pintamos de dourado e prateado, compramos gladeadores de ferro e ele jogava com os amigos. Eu brincava com ele que deveria ter o meu nome no jogo, já que a ideia partiu de mim também. Esse era um dos sonhos dele e o outro era se habilitar e levar todos os familiares em uma van, já que viajamos muito", relembrou. 

Dentre os sonhos de João, o adolescente desejava trabalhar criando jogos.
 

Mudança de rotina

Durante a pandemia, Mariana relatou que morava ela, o João, a mãe dela e um tio. Ela trabalhava em home office e ele estudava de forma online também, então, os dois acabavam ficando muito juntos.

"Quando eu acabava de trabalhar, ele falava que estava tudo pronto para a nossa sessão, víamos filme, série. A gente cozinhava junto, eu ensinei ele a fazer comida, e, quando não tinha muito o que fazer, pegávamos pão de forma, passávamos molho de tomate ou ketchup e colocávamos um queijo em cima ou calabresa e ele chamava de 'pão-itza'", contou ela, que dizia que o que o filho mais gostava de cozinhar era um molho rosé especial que ela ensinou com orégano e outros temperos. 

Após a morte do filho, Mariana passou a precisar de acompanhamento psiquiátrico para lidar com a perda e o trauma do acidente. 

"Eu esperando notícia no hospital tive crise, eu depois de receber a notícia que ele tinha morrido tive crise, foi crise após crise. Fui para casa e tive crise após crise. Me levaram no psiquiatra e ele me passou remédios que eu só dormia, hoje sinto dores no estômago de tanta medicação. Depois de um tempo, eu fui e falei pro médico que não podia ficar só dormindo porque quando eu acordava eu chorava e eu precisava viver isso, por mais dolorido que fosse. Com o tempo, diminuímos a dose, mas, agora, recentemente, desenvolvi uma crise de ansiedade, sinto minha mão e meu pé soarem muito e meu corpo tremer", disse ela.

Mariana hoje toma três remédios para tratar a ansiedade e outros sintomas que surgiram após o caso.
 

Atualmente, ela vive na casa de uma tia, dividindo o quarto com sua mãe, e não consegue voltar para casa que morava com o filho desde o dia 30 de julho. "Eu fui tão feliz lá, mas hoje é um lugar sem vida, que ficou um vazio", disse emocionada.

Além de morar na casa da tia, a rotina da mãe de João Gabriel mudou. Ela trabalha de home office, o que a ajuda a se distrair. Após o trabalho, no momento em que ela ficava com João Gabriel, Mariana passou a ver televisão com familiares, o que não é tão divertido e tão bonito como antes. Ela também busca ler e afirmou que parou até de fazer exercícios físicos, mas pretende voltar ao se recuperar.

  • Mariana precisava viver a base de remédios hoje para conseguir viver e superar suas crises de ansiedade
    Mariana precisava viver a base de remédios hoje para conseguir viver e superar suas crises de ansiedade
  • Mariana e João adoravam tirar fotos juntos fazendo caretas
    Mariana e João adoravam tirar fotos juntos fazendo caretas
  • Mariana e João adoravam tirar fotos juntos fazendo caretas
    Mariana e João adoravam tirar fotos juntos fazendo caretas
  • Mãe e filho viajavam juntos constantemente
    Mãe e filho viajavam juntos constantemente
  • Mãe e filho eram muito próximos e nutriam um amor eterno
    Mãe e filho eram muito próximos e nutriam um amor eterno
  • João era o único filho de Mariana
    João era o único filho de Mariana
  • João estava saindo de um aniversário quando tudo ocorreu
    João estava saindo de um aniversário quando tudo ocorreu
  • João era conhecido por ser um rapaz carinhoso com a mãe e com os amigos
    João era conhecido por ser um rapaz carinhoso com a mãe e com os amigos
  • Mãe e filho eram muito próximos
    Mãe e filho eram muito próximos
  • João morreu aos 16 anos
    João morreu aos 16 anos
 

Sobre o acidente

O acidente ocorreu no dia 30 de julho. Bruno Krupp estava em uma moto quando atropelou João Gabriel, que estava com a mãe saindo de uma festa de aniversário no play de um prédio na Barra da Tijuca para ir ao mar.

Mariana garante que não viu a moto de Bruno e, como ele estava em alta velocidade, ele surgiu do nada e ela só conseguiu ouvir um barulho alto. Testemunhas contam que Bruno estava a 150 km/h em uma pista de 60 km/h. 

"O acidente ocorreu durante a festa que já era para ressignificar que haviam 20 e poucos dias que meu tio havia morrido de infarto. Era aniversário da minha tia e meu tio queria ir, fizemos por ele. Fomos para a festa, foi uma comemoração tranquila, legal, João era até meio na dele, mas ele dançou e participou muito da festa e comentamos como ele estava mais solto. Ele era espontâneo comigo e minha mãe, mas em uma festa com mais gente ele era recatado. Saímos da festa e eu pedi pra ele ir na praia aquele dia, ele já tinha ido com o primo várias vezes, mas foi para me acompanhar. A gente parou no canteiro, olhamos para atravessar, não vimos nenhum veículo, atravessamos. Em questão de segundos, ouvi um barulho forte da moto e ela estava em cima da gente. Fiquei estatelada e achei que o João estava parado do meu lado, mas ele era mais alto e tinha a passada maior que a minha. Ele foi arrastado pela moto. Eu vi uma coisa voando alto e era a perna dele que tinha saído do corpo", contou. 

Ainda no dia do acidente, ela sofreu com algumas crises de ansiedade, se tremeu e ficou paralisada em alguns momentos. Ela viu João estirado na rua, sem a perna esquerda. 

"Ele não percebeu, graças a Deus, que estava sem a perna. Ele continuou consciente e conversando comigo, eu olhava pro céu, gritava, pedia para Jesus me acordar que era um sonho horrível, que meu bem mais precioso era o João. Abaixei ali no chão com ele, a gente orou, eu e ele, comecei a gritar pedindo ajuda e aí foram chegando pessoas. Eu tentava acalmar ele. Eu dizia que o amava e ele dizia que me amava. A médica chegou e disse que ele precisava de mim, eu respirei fundo e comecei a orar. Eu falava que Jesus estava cuidando dele. Dali, aglomeraram muitas pessoas, apareceu médico, pegaram gelo para a perna, tudo o que pôde ser feito, foi feito ali", afirmou. 

João foi levado pelos bombeiros para o Hospital Municipal Lourenço Jorge, na Barra da Tijuca. Durante a madrugada no hospital, Mariana teve contato com a mãe de Krupp sem saber. 

"Ela estava lá. Eu não sabia que era ela, ela estava chorando e algo me disse para eu dar um abraço nela. Foi quando eu perguntei se poderia abraçá-la, ela disse que sim e me pediu desculpa. Foi quando eu percebi que era a mãe dele e disse que nossos filhos ficariam bem porque Jesus estava cuidando deles lá dentro. Ela me deu um terço e aí depois logo falaram que o Bruno estava de alta e eles foram embora. Eu e minha família continuamos lá e, por volta das 5h da manhã do dia 31 de julho, após eu ter muitas crises de me tremer toda, me chamaram e quando olhei pro médico sabia a notícia. Ele me disse que, durante a cirurgia, o João teve uma parada cardíaca e não resistiu. O João era saudável, sai de casa com ele naquele sábado vendendo saúde e, de repente, eu recebi aquela notícia. Acabou tudo o que vivemos juntos, naquele dia, pedi para Deus me levar também, porque não fazia sentido continuar sem ele, já que eu vivia por ele. A dor era física, era uma dor dilacerante", disse ela emocionada contando que hoje encontra forças ao sentir a presença do filho e lutando por justiça pelo ocorrido.

Bruno ficou internado, porém foi preso em agosto por causa do crime. Ele permaneceu na Cadeia Pública Pedrolino Werling de Oliveira, conhecida como Bangu 8, no Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, até março deste ano, quando lhe foi concedido um habeas-corpus pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Desde então, ele segue em liberdade provisória. Dentre as medidas que Bruno tem que cumprir, entregar seu passaporte e não viajar para fora do país é uma delas. O modelo também deve usar uma tornozeleira eletrônica.

Foi decidido, nesta semana, que Bruno será julgado por um júri popular por homicídio doloso, quando há intenção de matar, pela morte de João Gabriel. Mariana sentiu um certo alívio e torce para que Bruno aprenda sua lição. 

"A justiça está sendo feita! Traz um cunho social, porque outros jovens na posição do Bruno vão pensar antes de fazer isso. Mesmo o Bruno tendo uma condição financeira boa, ele não teve um resultado tão favorável até então. Isso faz a gente acreditar que a justiça é para todos, como deveria ser e esperamos que as pessoas se preocupem mais com o próximo no futuro. Com pessoas mais conscientes, teremos menos vítimas. A vítima não foi o João Gabriel, a vítima foi a minha família inteira, mudou a vida de todos. Não tenho como trazer meu filho de volta, mas se eu puder lutar para que outras mães não passem pelo que eu passei e não tenham outros Brunos, eu vou ficar feliz por uma sociedade melhor", contou ela. 

Mariana torce pelo futuro do modelo. "Desejo que ele se oportunize para aprender tudo que precisa. Quando a gente aprende o que precisa, nos tornamos seres humanos mais felizes. Espero, no futuro, ouvir que ele se ressignificou. Espero que ele se torne um ser humano mais consciente e desejo o bem, que ele seja responsabilizado, mas saía disso um Bruno melhor do que entrou", finalizou. 

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