Política
Descontos x demissões em escolas e universidades do RJ
A Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) reuniu nesta quarta-feira (8) representantes do setor educacional privado em audiência virtual para discutir o projeto que impõe desconto de até 30% nas mensalidades escolares durante a pandemia de Covid-19.
O projeto de lei (nº 2052/2020) proposto pelo presidente da Alerj, André Ceciliano (PT), ainda está recebendo emendas nas comissões. O desconto, se aprovado, será aplicado do ensino infantil até o superior.
A audiência foi presidida pelo deputado estadual Flávio Serafini (Psol), presidente da Comissão de Educação. O parlamentar tentou mediar um consenso entre pais e alunos, entidades de classe e as instituições de ensino.
“O objetivo é tentar contribuir para uma repactuação que traga mais equilíbrio ao setor, para que a gente não tenha aumento da inadimplência ou rompimento de contratos”, destacou Serafini.
Enquanto os pais e estudantes alegam sofrer impactos da crise na renda familiar, as escolas e universidades particulares alertam para possibilidade de demissões, crise financeira e falência.
Apesar das instituições de ensino terem questionado a constitucionalidade do projeto, a proposta foi aprovada pela Constituição de Justiça (CCJ) e chancelado pela defensora pública Patrícia Cardoso, que vê competência da Alerj para legislar sobre relações de consumo.
Ensino básico
Ao todo, cerca de 1,5 milhão de estudantes são atendidos pelas escolas particulares no ensino fundamental e médio no estado do Rio, de acordo com o Sindicato de Escolas Particulares (Sinepe-Rio). Destas escolas, 70% tem até 500 alunos, informou a instituição.
Para o presidente do Sinepe-Rio, Luiz Henrique Mansur Barbosa, o setor não conseguirá arcar com a crise econômica decorrente da pandemia, caso haja descontos. As escolas já enfrentavam crescimento da inadimplência no último ano, explicou.
“Cerca de 70% da despesa das escolas é com pessoal. A escola essencialmente é mão de obra. Se a gente não conseguir esse equilíbrio, certamente terão demissões, embora o setor não queira isso”, alerta Mansur.
O ensino infantil e os anos iniciais do fundamental estão com as aulas suspensas por conta das medidas de isolamento social. Os colégios se adaptaram, em sua maioria, ao ensino a distância para os anos finais e ensino médio.
A possibilidade preocupa também o Sindicato dos Professores (Sinpro-Rio), representado na audiência pelo presidente Professor Elson.
"A prioridade é a garantia de emprego aos profissionais que trabalham nas escolas. O debate é importante, mas não pode estar desvinculado a questão do salário e da garantia de emprego aos professores”, pontuou o Elson.
Ensino Superior
Nas universidades particulares, que concentram 75% das matrículas do ensino superior no estado do Rio, a modalidade à distância foi instaurada por orientação de nota técnica do Ministério da Justiça.
A nota autorizou as universidades a substituir as aulas presenciais por virtuais sem redução das mensalidades para evitar colapso no setor. No estado do Rio, o setor emprega 400 mil professores e técnicos administrativos.
Para o Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior do Rio de Janeiro (Semerj), a redução das mensalidades vai prejudicar principalmente as faculdades de menor porte.
A vice-presidente do Semerj, Elizabeth Regina Nunes Guedes, defende que os descontos sejam concedidos caso a caso, num plano de negociação individual.
“É uma conta que não fecha. Se por um lado todo mundo quer desconto, por outro querem que os professores e técnicos administrativos sejam mantidos. Esse desconto linear vai atender muitas pessoas que não precisam e não será suficiente para muitos que precisam”, criticou Elizabeth.
Para os estudantes e alunos, o desconto é urgente e vai evitar inadimplência e trancamento massivo de matrículas. Há preocupação, ainda, com falta de acesso a tecnologia e internet para cursar aulas online ou reposição de aulas laboratoriais.
A presidente do diretório estudantil do Centro Universitário Augusto Motta (Unisuam), Débora Santos, não acredita na autonomia das reitorias para concessão dos benefícios.
“É muito importante pautar essa questão pela Alerj porque as universidades nunca estão dispostas a acordos. Ou a gente escolhe a inadimplência e o trancamento de matrículas, ou a gente escolhe a redução da mensalidade”, alerta a acadêmica.
O diretório estudantil da rede Estácio de Sá, representado pela estudante Natália Martins, acredita que a redução de custos por conta da modalidade online pode ensejar o desconto.
“Dos 200 mil alunos, muitos são trabalhadores e tiveram sua renda brutalmente ceifada, o que dificulta muito que a gente consiga pagar as mensalidades. Queremos desconto para que a gente consiga arcar com esse custo”, reforça a universitária.
Como resposta, a direção da Estácio garantiu que vai abrir edital para oferecer 20 mil bolsas integrais para alunos em situação mais vulnerável e um pacote de descontos mensais variáveis ou parcelamento estendido.
Projeto em construção
A partir da contribuição da audiência, a Comissão de Educação vai propor mudanças no projeto. A ideia é criar um desconto proporcional de acordo com o valor da mensalidade, mas o parecer ainda não foi concluído.
No substitutivo apresentado pelo relator do projeto na CCJ, o deputado estadual Jorge Felippe Neto (PSD) já havia sugerido desconto proporcional de acordo com o número de alunos da instituição. O texto excluiu instituições com menos de 200 alunos e apresentou emendas sobre inadimplência.
A próxima audiência sobre o tema das mensalidades será na segunda-feira (13), a partir das 15h, por videoconferência. A reunião foi convocada pela Comissão de Ciência e Tecnologia. De acordo com o presidente da comissão, Waldeck Carneiro (PT), o projeto final deve levar em conta diferentes variáveis.
“Talvez o número de alunos apenas, embora seja uma avaliação válida, seja insuficiente, pois há necessidade de pensarmos em outras questões, como o valor das mensalidades, taxas de inadimplência, e o lucro líquido das instituições na série histórica dos últimos três exercícios”, afirmou Waldeck.
Através de sua assessoria, o presidente da Casa, André Ceciliano (PT), informou que o projeto irá ao plenário após acordo entre as partes. Para valer, a lei precisa ser sancionada pelo governador Wilson Witzel (PSC). No entanto, representantes de instituições já ameaçam contestação na Justiça.
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