Filme

Triângulo da Tristeza

Erika Figueiredo revela a crítica por trás do longa

Ingresso.com
 

Esse é o nome em português de Triangle of Sadness, excelente filme-crítica à sociedade moderna, que concorreu a vários oscars, mas, talvez por justamente cumprir seu papel – questionar a modernidade e as escolhas que fazemos – não tenha levado nenhuma estatueta para casa.

O filme traz em si outra particularidade: uma de suas protagonistas, a atriz sul-africana Charlbi Dean, que interpretou a modelo e influencer Yaya, morreu em agosto de 2022, de septicemia, aos 32 anos de idade. Talvez seja mais um motivo para reflexão, já que pensarmos na morte seja um bom início, para reavaliarmos a vida.

A película começa mostrando um casal de modelos, Yaya e Carl, que ganha a vida em campanhas publicitárias, desfiles e superexposição nas redes sociais. Essas aparições rendem-lhes dinheiro , cortesias e convites, dos quais desfrutam, até que são convidados para um cruzeiro, em um iate de luxo.

CONTÉM SPOILER

Longa faz um a crítica à sociedade moderna
Longa faz um a crítica à sociedade moderna |  Foto: Divulgação
 

Yaya aparenta ser mais fútil do que Carl, e até por isso, menos capaz de amar. Vive da imagem que construiu para si, e posta no instagram sem parar. No início do filme, eles discutem, tendo dificuldades no alinhamento de suas visões de mundo e intenções acerca da relação. Carl deseja pedi-la em noivado, durante o cruzeiro... mas nada sai conforme imaginado.

Após dias de muita frivolidade, excessos múltiplos de todos a bordo, e um jantar do Comandante que se torna um terror, o iata naufraga e vai parar em uma ilha. Apenas 8 pessoas sobreviveram e lá estão, em uma situação calamitosa. Ali, o dinheiro, a fama e o poder valem nada.

Todos os medos, fragilidades, limitações , vícios e virtudes estão expostos, nesta ilha perdida no meio do oceano, em que os sobreviventes precisam buscar meios de subsistirem, até que venha o socorro – que é incerto.

Dentre os sobreviventes, a chefe da tripulação, um funcionário da casa de máquinas e a chefe das camareiras, Abigail. Os demais são passageiros, dentre os quais o casal de modelos, um multimilionário russo e um bilionário do ramo das big techs. A oitava sobrevivente é uma cadeirante, vítima de um derrame, que só consegue comunicar-se por meio de uma frase: “In den Wolken”, que em português quer dizer “nas nuvens”.

Abigail logo assume a liderança do grupo: é a única que sabe pescar, acender fogueira, criar condições para a estadia de todos na ilha. Intitula-se Comandante e diz que, se no navio era empregada, a situação inverteu-se, pois demonstra capacidade de subsistência em situações extremas, o que não ocorre com os demais náufragos.

Recebe propostas dos milionários que ali estão, para quando saírem da ilha, caso seja generosa e compartilhe a comida , ao que gargalha e diz que não há garantias de que sairão dali, onde o dinheiro e o poder dos passageiros, de nada vale. A lei da selva é dura e privilegia os fortes. Todos, ali, dependem dela para sobreviver.

Se tempos difíceis forjam homens fortes, tempos fáceis criam homens fracos, e é o que se depreende do grupo que está na ilha: sem as adequadas condições de vida, não sabem como manter-se, preservar-se, existir. Nem mesmo os outros dois tripulantes foram preparados, para serem autossuficientes.

Quando Abigail sugere que os homens fiquem de vigília à noite, e as mulheres vão dormir no bote, estes ficam extremamente incomodados. Afinal, não foram criados para assumirem seu papel, de proteção e força, em situações extremas. Aliás, sequer atravessaram situações extremas. Oferecem relógios de 150 mil euros e outras vantagens, a fim de modificarem a opinião da nova “comandante”, porém sem sucesso: Abigail sabe que, ali, o que vale é a capacidade de sobrevivência.

O corpo da irmã do multimilionário russo aparece na praia. Este emociona-se e chora abraçado a ela, mas não sem antes retirar-lhe as joias e guarda-las dentro do sapato. Poder e dinheiro estão, indissociavelmente, atrelados à personalidade dele.

Os homens, que deviam estar de vigília, pegam no sono e deixam o fogo apagar. Não conseguem alcançar o fato de que a sobrevivência do grupo depende de todos. Dois deles comem escondido um pacote de pretzels, que estava na mochila de Abigail.

Na dificuldade, personalidades exsurgem, temperamentos afloram. A nova comandante faz um jogo perigoso de divisão de tarefas e privilégios, sempre reserva o melhor para si mesma. E ninguém discute as ordens. Os dias seguem e Carl, em troca de comida e privilégios, estabelece uma relação sexual com Abigail. As coisas transcorrem como no comunismo. Abigail detém o poder e sabe exercê-lo, com força e intimidação.

Até que, em uma expedição pela ilha, Yaya encontra um resort! Este sempre esteve ali, mas como a ilha era grande, não se deram conta. Ela corre ao encontro de sua “comandante”, a fim de avisá-la da descoberta. É então que Abigail, na iminência de perder seu poder, seus privilégios e sua preponderância sobre os demais, mata Yaya. E assim termina toda história socialista.

Erika Figueiredo - Filosofia de Vida

Erika Figueiredo - Filosofia de Vida

A niteroiense Erika Rocha Figueiredo é escritora, professora e promotora de justiça

< Filho de Tim Maia posta foto rara ao lado do pai: 'Gênio indomável' Galpão com 15 veículos roubados é encontrado na Zona Norte do Rio <