Cidades

Transoceânica: projeto alterado e valor de alto custo

Estações intermediárias são de modelo mais simples que as estações de Charitas e Engenho do Mato. Foto: Eduarda Hillebrandt

Mais uma etapa da Transoceânica, aguardada obra de mobilidade urbana de Niterói, entrará em operação neste sábado (27) com três novas linhas de ônibus. O projeto é composto por um corredor viário de 9,3 quilômetros de extensão e 13 estações de embarque, de uso exclusivo do Bus of High Level of Service (BHLS) — sistema de ônibus com embarque nos dois lados. Entretanto a entrega prevista acontece após atrasos e alterações no projeto original.

O contrato assinado pela Empresa Municipal de Moradia, Urbanismo e Saneamento (Emusa) em setembro de 2014 com o consórcio das empreiteiras Constran e Carioca Christiani-Nielsen previa R$ 310,8 milhões para as obras, que deveriam estar concluídas em 2016. Ao longo do contrato, no entanto, uma série de elementos fugiram ao planejado, aumentando cifras, estendendo prazos e alterando o projeto.

A soma dos valores divulgada em extratos de 15 termos aditivos e três apostilamentos publicados no Diário Oficial do município indica que o custo pode ter superado em até 40% o valor inicial, chegando a R$ 438,1 milhões. A elasticidade dos prazos também chama atenção: a conclusão do corredor e das estações se deu dois anos e meio após o prazo inicial.

Projeto

Túnel Charitas-Cafubá entre as principais etapas do projeto inaugurado em maio de 2017. Foto: Ascom Niterói

A Transoceânica foi financiada pela segunda rodada do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), somado a um empréstimo externo oferecido pelo Banco Nacional Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF) e verbas do município. Por integrar o pacote de obras do PAC, a Transoceânica foi licitada usando o Regime de Contratação Diferenciada (RDC), um formato que permite que a própria empresa faça o projeto executivo da obra.

"Não tenho dúvida de que foi esse formato de contração que exigiu tantas mudanças ao longo da obra, que precisaria de um planejamento mais rigoroso", comenta o vereador Bruno Lessa (PSDB) que, ao longo do mandato, protocolou dezenas de requerimentos pedindo documentos da obra.

"A Transoceânica saiu muito mais cara que o previsto, e tenho dúvidas sobre a sua eficácia enquanto modal de transporte público, pois não resolvem o fluxo para a região central e para o Rio", completa.

Nos diversos vídeos publicados pela Prefeitura de Niterói sobre a obra, o projeto previa a integração com a Estação de Catamarãs de Charitas, cuja tarifa custa atualmente R$ 17,60 —  o Governo Estadual afirmou que ainda estuda a implementação da tarifa social.

Transparência

Os termos aditivos somados ao projeto somam R$ 81,5 milhões, entretanto os primeiros nove aditivos, publicados entre 2016 e 2017, não estão disponíveis para consulta na sede Emusa. Deste grupo, dois aditivos não mencionam a razão dos aumentos; três reajustam o valor sob a justificativa de "acréscimo de obrigações" à empresa contratada e um apenas aumenta o prazo.

O quarto aditivo, de menor valor, acrescenta R$ 341 mil ao contrato por conta da elaboração de remoção parcial do Hospital Psiquiátrico de Jurujuba para construção do Túnel Charitas-Cafubá.

O segundo grupo de aditivos, assinados em 2018 e 2019, estão disponíveis na base de contratos da Emusa. O aditivo nº 10, por exemplo, requisita a construção de ciclovias paralelas a Estrada Francisco da Cruz Nunes. O aditivo nº 11, por sua vez, inclui uma faixa de rolamento próxima ao shopping Itaipu Multicenter. Publicado na mesma data, o aditivo nº 12 estabelece o remanejamento de uma rede adutora de água e esgoto. Os três últimos aditivos prorrogam os prazos de entrega da obra.

Ao longo do contrato, os custos também foram revisados em R$ 45,6 milhões por apostilas, que segundo a legislação permite a substituição de termos aditivos, estando liberado pela Prefeitura fazer uso do procedimento para cobertura de custos adicionais como multas e compensações financeiras.

Segundo o vereador Bruno Lessa, embora parte do custeio da Transoceânica tenha sido feito no âmbito do PAC, via Caixa Econômica Federal, as contrapartidas são do município.

"O que foi somado ao contrato pelos aditivos saem do orçamento da Prefeitura e a Emusa tem sido pouco transparente sobre esse contrato", destaca o vereador.

Para Antônio Oscar, integrante do Conselho Municipal de Transparência e Controle Social, os órgãos municipais devem seguir o princípio da transparência ativa: "Ou seja, ainda que o cidadão possa protocolar seu pedido de acesso à informação pelo sistema do município, os contratos deveriam estar disponíveis para o público".

A reportagem solicitou a íntegra dos aditivos através do Serviço de Informação ao Cidadão e na própria sede da Emusa, mas os requerimentos seguem em análise.

Fiscalização

Projeto sofreu diversas alterações desde o início das obras. Foto: Eduarda Hillebrandt

Para o advogado e assessor do Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM), Marcos Flávio Gonçalves, os aditivos não indicam problemas de gestão.

“Em projetos complexos, é comum que ocorram inúmeros imprevistos e adequações. Ainda que existam limites para os acréscimos, também existem muitas exceções”, explica Gonçalves.

Ao que indicam auditorias do Tribunal de Contas do Estado (TCE) publicadas em janeiro de 2018, o primeiro aditivo apresentou sobrepreço de R$ 4,6 milhões, enquanto o edital de licitação apresentou sobrepreço estimado em R$ 10,9 milhões. Na época, o TCE informou que a Secretaria-Geral de Controle Externo (SGE) seguiria fiscalizando os contratos, mas não fixou data para a apreciação do caso pelo corpo deliberativo.

O foco da auditoria seria os contratos paralelos ao projeto da Transoceânica. Isso porque, embora as construtoras tenham instalado as estações de Charitas e Engenho do Mato, o contrato não incluiu as 11 estações de embarque intermediárias, que foram instaladas pelas empresas Pimentel & Ventura e Metalco do Brasil, em contratos que somam R$ 10,9 milhões. Procurada, a Secretaria-Geral de Controle Externo (SGE) ainda não confirmou se há alguma auditoria em andamento.

Segundo a Prefeitura de Niterói todos os contratos e aditivos da TransOceânica foram submetidos aos órgãos oficiais de controle. Em resposta à reportagem, detalhou parte dos aditivos.

De acordo com a Prefeitura, o aditivo 1 refere-se a custos administrativos entre outubro de 2014 e maio de 2015, modificação de projetos geométricos dos trechos 5, 6 e 7, reforço estrutural no trecho 4 e execução de galeria de drenagem em aduelas no trecho 3, rede de drenagem no trecho 3 e 4 e rede elétrica dos túneis.

O aditivo 2 é referente a recuperação de pavimento na Avenida Raul de Oliveira Rodrigues e da recuperação das ruas Engenheiro Ary Gomes, Brasília e Roma.

O aditivo 3 é referente à demolição e reconstrução do muro dos Bombeiros, alteração da locação da subestação do Hospital Psiquiátrico de Jurujuba, retorno na Rua 14 de Abril, trecho 01, um acréscimo de área de calçadas no trecho 1 (orla da praia de Charitas), recapeamento de asfalto no trecho 1 em frente ao hospital psiquiátrico, modificação do projeto de acesso ao Preventório com incorporação de retorno na Avenida Prefeito Silvio Picanço, e também substituição da iluminação do túnel de vapor de sódio para led. O aditivo 5 refere-se à sinalização vertical e semafórica.

O aditivo 8 é referente à projeto de escada no Morro do Preventório, demolição de duas casas no trecho 1, execução de escada de acesso ao Morro do Preventório; contenção de blocos rochosos no talude do emboque de Charitas, alteração na largura da rua na rótula do Cafubá, iluminação no trecho 1, execução de retorno no trecho 3 e pavimentação da Rua Dr. Valdir Costa, corrimão na ciclovia do trecho 3 e projeto e construção de muro do Drenage na região do Grotão.

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