Sinais de alerta
Saiba como identificar e sair de um relacionamento abusivo
Tema veio à tona após o caso de Bruna e Gabriel no BBB23
O relacionamento entre Gabriel, do grupo 'Pipoca', e a atriz Bruna Griphao, do 'Camarote', no BBB23 está dando o que falar nas redes sociais. O nome dos dois invadiu a internet antes e depois da 'bronca' dada ao vivo por Tadeu Scmidt no último domingo (22), onde ele disse a Gabriel que "numa relação afetiva, certas coisas não podem ser ditas nem de brincadeira". Muitos passaram a afirmar que o relacionamento dos dois é tóxico. Bruna, após o ao vivo, foi indagada pelo modelo se achava que o relacionamento deles era tóxico e ela disse que não. A partir do caso, o ENFOCO ouviu uma assistente social, uma advogada especialista em violência doméstica e uma delegada para entender o que se caracteriza como um relacionamento tóxico/abusivo e como as mulheres podem sair de uma situação como esta para não acabar em tragédia.
Segundo a assistente social Marisa Chaves, de 59 anos, existem indicadores psicológicos e físicos que as mulheres devem ficar atentas para situações tóxicas e abusivas.
"Se ela é uma pessoa que está sempre isolada socialmente, só sai em companhia do parceiro, não tem autonomia para encontrar com amigas, ir na casa de familiares. Outro indicador é quando o namorado e parceiro controla todos os passos da mulher, monitorando com quem ela saiu, quando foi, quando vai voltar, fica mandando mensagem para a mulher na ausência dela ou exige que ela faça uma chamada de vídeo para comprovar se ela está no lugar em que fala que está. Outro indicador ainda é a pessoa mudar de comportamento de forma abrupta. Ele está numa festa sociável, brincalhão, mas sozinho com a parceira ele a trata de forma agressiva, violenta e rude", adverte Marisa que atua há 33 anos no Movimento de Mulheres de São Gonçalo (MMSG). Ela é fundadora e gestora de projetos do movimento.
A militante da causa de proteção à mulher também descreve outros indicadores psicológicos e físicos. São eles: o homem passa a tratar as pessoas que discordam dele de forma rude, não sabendo lidar com frustação, além de gostar de destruir objetos pessoais. O ciúme exacerbado também é um fator preocupante, além de tentar impedir que a companheira cresça no campo profissional, político e comunitário.
Psicologicamente, a mulher passa a ter uma baixa autoestima, acredita ser uma péssima mãe porque o homem determina e fala isso para que ela acredite que depende dele. Ela não consegue dar opiniões porque é silenciada pelo companheiro, não tem interação social e prefere não se expressar.
Fisicamente, a mulher que está num relacionamento tóxico pode não se cuidar fisicamente, psicologicamente e até ginecologicamente. Ela tem medo de se cuidar para não chamar a atenção de outras pessoas e para que isso não cause brigas com seu parceiro.
"Violência vai além do físico. Uma mulher silenciada toda vez que vai emitir opinião recebe um fora, é cortada, o homem responde por ela, avança na frente dela e etc. Enfim, reduz a autoestima dela. Violências morais como xingamentos, calúnias e difamação são tipos de violência que vão além da física e marcam tanto que a mulher deixa de se socializar e de estar no mercado de trabalho. Também existe a violência patrimonial, quando a mulher se ver forçada a emprestar o nome ou quando o parceiro usa dados bancários e cartão de crédito sem que ela tenha controle para isso. Até mesmo quando ela é determinada por ele para passar uma procuração de plenos poderes ao parceiro para que ele administre seus bens pessoais ou heranças de família. Além de violência sexual, que vai além da penetração, como ser forçada a ver pornografia", explica Marisa Chaves.
CICLO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
A advogada Marilha Boldt, de 37 anos, também detalha o ciclo de violência doméstica. Segundo a idealizadora do projeto Superação da Violência Doméstica, que funciona nas redes sociais, os namoros e relacionamentos tóxicos começam na fase 1: com a escalada da tensão caracterizada por agressões verbais, ciúmes, ameaças, abusos emocionais, e a mulher vive com medo de contrariar o seu parceiro. A fase 2 é marcada pela explosão da violência, quando começam os descontroles e as agressões físicas e sexuais graves. Já a fase 3 é a da lua-de-mel, do arrependimento, das juras de amor e das promessas de mudança. Esse ciclo se repete constantemente. Da fase 3 os abusadores voltam para a fase 1.
"As relações tóxicas não começam com um tapa na cara, mas com carinho. Vem um momento de tensão, e o parceiro começa a humilhar, xingar, que é o momento da explosão. Depois, ele pede desculpas ou simplesmente faz um carinho, passando a imagem de que está tudo bem, mas depois de alguns meses volta a ter outra tensão e explosão. A mulher fica no imaginário de que foi só aquela vez e esquece, como mecanismo de defesa, que sofreu inúmeras violências. Ela fica romantizando a relação e lembrando dos momentos bons. O homem se impõem também com a pressão social de que a mulher deve se submeter ao marido, ao homem. E como ele se coloca no pedestal, ela se sente inferior achando que merece esse tratamento", ressalta a advogada.
Marisa Chaves e Marilha Boldt lembram ainda que é difícil identificar um relacionamento abusivo, já que a sociedade ainda é machista e normaliza xingamentos e humilhações. A partir daí, a vítima perdoa e passa a criar dependência emocional e financeira, dificultando o término.
"Para quem está nessa situação e deseja sair é importante contar com o apoio da família e dos amigos. A importância da familia e dos amigos é de acolher e jamais julgar, porque ela já se sente culpada por tudo o que viveu e qualquer pressão e julgamento so irão piorar", contou Marilha. Além disso, a terapia pode ser uma amiga e é necessário evitar contato com o ex e agressor. Não ver nada sobre ele na internet também é importante para cortar o vínculo.
Dados ASSUSTADORES
No primeiro semestre de 2022, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública contabilizou uma média de quatro mulheres mortas por dia no primeiro semestre de 2022. Ao todo, 699 mulheres foram vítimas de feminicídio ao todo no país nessa época do ano passado. O número aumentou cerca de 10% em relação a 2019 e de 3% em relação ao primeiro semestre de 2021, quando o número de feminicídios no país chegou a 677 vítimas. Esta é a maior taxa de feminicídio em um semestre no Brasil.
Em 2022, o Instituto de Segurança Pública (ISP) do Estado do Rio contabilizou um total de 430 feminicídios em dezembro de 2022 e 397 no mesmo período em 2021, tendo uma variação de cerca de 8%. De janeiro a dezembro de 2022, foram registrados 5.627 casos de feminicídio em 2022, já no mesmo período em 2021, a variação foi de 10%, registrando mais de 5 mil casos.
CRIMES TIPIFICADOS
Segundo a delegada Carla Tavares, da Deam de São Gonçalo, em 2022, foram registrados mais de 2 mil casos de mulheres vítimas de violência doméstica. A violência pode ser sexual, patrimonial, física e psicóloga. Todos devem ser registrados na Deam e cerca de 90% desses casos mencionados são de mulheres violentadas por namorados, maridos e ex-parceiros.
"Qualquer pessoa com relação íntima de afeto, incluindo namorados" pode ser denunciado e se enquadrar na Lei Maria da Penha, criada em 2006.
Segundo ela, boletins de ocorrência podem ser feitos com diversos tipos de agressão como moral e verbal, além da física. "Tivemos, recentemente, uma alteração no Código Penal que inclusive tipificou o crime de violência psicológica e aí entramos nas relações tóxicas. Quando temos uma relação tóxica, podemos enquadrar numa violência psicológica contra a mulher, que é o artigo 147- B do Código Penal", afirmou a delegada.
Os seguintes delitos a seguir devem ser denunciados pelas vítimas:
Violência moral - quando o homem agride verbalmente a mulher, ofendendo sua moral, chegando até a falar de atributos físicos dela.
Ameaça - quando ele tenta coagir a mulher para que ela faça algo ou quando ele diz que vai fazer alguma coisa caso essa mulher não fique com ele, como, por exemplo, que ele irá matá-la se ela ficar com outro homem.
Violência física - incluindo a agressão física propriamente, como lesão corporal ou até feminicídio e tentativa de feminicídio.
Violência sexual - quando o homem obriga a mulher a manter qualquer tipo de relação sexual com ele e não precisa ter penetração, podendo ser um ato libidinoso não consentido pela mulher.
Segundo a delegada, os familiares também podem denunciar os casos de violência mesmo que as vítimas de um relacionamento tóxico não o façam.
"Quando falamos de um relacionamento tóxico, infelizmente, a maioria das mulheres não consegue se perceber nessa relação tóxica, como vimos em rede nacional com a Bruna. Ela acha que isso é carinho, amor e cuidado por parte do homem. Nesses casos, o ideal é que as pessoas que percebem a mulher numa condição dessa conversem com essa mulher. Percebendo que essa mulher não toma uma atitude e não procura uma delegacia, em se tratando de violência psicológica, um crime que é de ação penal pública incondicionada, ou seja, independente da vontade da vítima, qualquer familiar que conheça uma mulher que esteja passando por essa situação pode procurar a delegacia e fazer um registro. A partir daí, pedimos uma medida protetiva para essa mulher e a chamamos na delegacia para ela conversar e fazer ela entender a situação em que está", disse ela.
A partir daí, a vítima pode ser encaminhada para o Centro Especial de Orientação à Mulher (Ceom) ou Centro Especializado em Atendimento à Mulher (Ceam), para um hospital, para a defensoria pública se necessário. "A Deam está aqui não só para fazer o registro de ocorrência, mas para dar apoio à essa vítima", disse a delegada, que afirma que qualquer incômodo que a mulher tenha com seu parceiro ela deve ficar atenta.
Ameaça, injúria, difamação, estupro, estelionato, apropriação indébita, lesão corporal, tentativa de feminicídio, violência psicológica são crimes que estão no Código Penal e podem ser denunciados.
Como denunciar
Para aquelas mulheres que querem denunciar seus parceiros, a dica é procurar a delegacia mais próxima e fazer um boletim de ocorrência. Além disso, também é possível entrar em contato com a Central de Atendimento à Mulher pelo número 180 ou com a Polícia Militar pelo 190.
O Movimento de Mulheres de São Gonçalo também tem um canal direto que ajuda as vítimas de violência doméstica.
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