Memória
Tradicional sapataria de Niterói luta para manter viva a profissão
Localizado no Centro, o espaço está na cidade há 82 anos
Todos têm uma história com sapateiros. Em Niterói, na Região Metropolitana do Rio, é quase impossível que essa história não cruze com a tradicional sapataria Zás-Trás, um reduto de memórias e consertos localizado na Travessa Alberto Vitor, no Centro da cidade.
Com 82 anos de tradição, o local luta para manter viva a profissão na cidade, que, apesar das dificuldades atuais, continua a ser celebrada em todo o Brasil nesta sexta-feira (25), no Dia do Sapateiro.
É muito bonito poder resgatar isso
“Vai além do conserto de calçados, é um ato de utilidade pública. Aqui mantemos viva essa tradição em Niterói, mostrando que o que é bem feito pode durar e ser valorizado. É muito bonito poder resgatar isso”, enfatiza o proprietário, Silvio Silguer, de 70 anos.
A Zás-Trás foi fundada no dia 29 de junho de 1942 pelo tio de Silguer, de quem ele herdou a profissão. Com mais de 40 anos no mesmo ponto, ele conta como o ofício se transformou ao longo dos anos e, hoje, enfrenta dificuldades como a falta de mão de obra.
Um Relatório Setorial elaborado pela Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), ao qual o ENFOCO teve acesso, mostra que em 2023, estima-se que houve redução de 5,4% na produção mundial de calçados.
Desafios
No Brasil, ainda no contexto da indústria calçadista, entende-se por atelier uma empresa que presta serviços de produção - corte, costura, pré-fabricação, bordados e outros - a um fabricante de calçados, sem ser detentora do produto acabado.
Do valor de R$ 33,3 bilhões da produção de calçados em 2023, 3,6% esteve atrelado aos serviços de produção (atelier), participação essa que foi 0,3 ponto percentual superior àquela observada em 2022.
É triste ver um ofício tão bonito e útil ser deixado de lado
Entre os serviços utilizados, segundo o relatório da Abicalçados, a costura foi o que apresentou maior expansão, com um incremento de 1,7 ponto percentual, atingindo participação de 64,9%, do total do valor dos serviços de produção na indústria calçadista em 2023. A costura possui, ainda, a maior representatividade entre os serviços de produção utilizados.
“Antigamente, éramos 25 sapateiros e 10 atendentes. Hoje, não conseguimos encontrar ninguém disposto a trabalhar como sapateiro. Os jovens simplesmente não se interessam em aprender essa profissão. É triste ver um ofício tão bonito e útil ser deixado de lado”, compartilha Silvio Silguer, de 70 anos.
Mesmo assim, a sapataria continua a fazer parte da rotina dos niteroienses. Ao entrar, se prestar atenção, o lugar ainda exala os sons familiares que atraem a clientela: o tilintar de ferramentas, o aroma do couro e, claro, o som do martelo batendo no sapato, que inspirou o nome do estabelecimento.
Uma das clientes mais fiéis de Silvio, a aposentada Jaciara Mendonça, 66 anos, descreve a sapataria como o “hospital do calçado”. Para ela, que chegou a conhecer o tio dele, cada visita é um reencontro.
Esse ofício é essencial para a sociedade
“O Silvio é um 'médico' de primeira! Ele transforma o que muitos jogariam fora em algo que parece novo, com sola, salto e pintura. É uma arte! Cada vez menos sapateiros estão por aí, e isso é preocupante, porque esse ofício é essencial para a sociedade”, afirma.
As longas filas durante a semana são uma prova de que o trabalho de Silvio ainda é bastante reconhecido na cidade. Outro morador da região, Francisco Luvisi, 55 anos, vai ao local pelo menos uma vez por mês e diz que, embora demore para ser atendido às vezes, sempre vale a pena.
Felizmente temos essa joia aqui em Niterói
“O bom humor dele é característico. As longas filas são a prova de que o que ele faz é muito valorizado, e, mesmo que às vezes demore um pouco, a espera sempre vale a pena. É triste ver que sapateiros estão se tornando cada vez mais escassos, mas felizmente temos essa joia aqui em Niterói”, compartilha.
E assim, com cada martelada, o estabelecimento mantém viva uma profissão que, além de ser uma das mais antigas do mundo, ensina uma lição valiosa para os niteroienses: tudo tem conserto.
Posso contribuir para a memória e a cultura de Niterói
“É fundamental que essa tradição não se perca, pois cada conserto que fazemos é uma oportunidade de preservar histórias e memórias que merecem ser lembradas. É gratificante saber que, através do meu trabalho, posso contribuir para a memória e a cultura de Niterói”, conclui Silvio.
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