'Nunca é tarde para um diploma', dizem mães que voltaram a estudar

Mãe e moradora do Morro do Castro, em São Gonçalo, Divania Gomes, de 53 anos, se junta aos mais de 500 mil inscritos no Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja) de 2024. A prova oferece uma chance única para alcançar o tão desejado diploma, permitindo que aqueles que não puderam concluir o Ensino Fundamental ou Médio na época adequada finalmente o obtenham.

Em 2023, as mulheres foram maioria entre os participantes do Encceja, representando 55% das inscrições. A faixa etária predominante situa-se entre 31 e 59 anos, abrangendo 40% do total de inscritos. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), uma das principais causas da evasão escolar entre as mulheres é a necessidade de trabalhar. 

Este é o caso de Divania. Mãe de três filhos, ela abandonou os estudos aos 21 anos, no primeiro ano do ensino médio, para trabalhar e se tornar dona de casa.

Infelizmente, minha família não tinha condições de bancar essas despesas extras na época.

"Parei de estudar por dois motivos. Primeiro, para trabalhar, pois precisava ajudar financeiramente em casa. E, além disso, estava prestes a me casar e queria arcar com as despesas do enxoval por conta própria. Infelizmente, minha família não tinha condições de bancar essas despesas extras na época", compartilhou.

'Enquanto há vida, há esperança'

Hoje, aos 53 anos, Divania relata o quão difícil foi voltar a acreditar na possibilidade de retomar os estudos e conquistar um diploma. Atualmente, ela não está matriculada em nenhuma escola ou "cursinho" para vestibular, mas se prepara com o apoio dos filhos.

Achava que não era capaz, que não conseguiria.

"Na verdade, nunca pensei em voltar. Achava que não era capaz, que não conseguiria. E meus filhos têm me incentivado. Eles dizem 'mãe, volta para terminar os estudos. Você ainda tem 53 anos, há muito pela frente'. Então decidi voltar para ver no que vai dar. Afinal, enquanto há vida, há esperança", afirmou.

'Larguei para cuidar do meu filho'

Para Andresa Martins, de 47 anos e também moradora do Morro do Castro, não tem sido fácil. Mãe de quatro filhos, ela interrompeu os estudos no 9º ano do ensino fundamental, aos 19 anos.

Até ele completar 6 meses, o levava comigo, mas ficou impossível porque já estava crescendo e não ficava quieto.

"Morava ainda com minha mãe e, quando me tornei mãe, não tinha com quem deixá-lo para ir à escola. Até ele completar 6 meses o levava comigo, mas ficou impossível porque já estava crescendo e não ficava quieto. Aí vi que precisava largar", relatou ela.

Neste ano, motivada pelo desejo de cuidar de si mesma, Andresa decidiu retomar os estudos à noite no Colégio Estadual Conselheiro Macedo Soares, no Barreto, em Niterói. Ela compartilha a dificuldade de se readaptar ao ambiente escolar depois de tanto tempo afastada.

A mente já não é a mesma de 29 anos atrás, mas estou indo bem. E, com muita dedicação, acho que chego lá.

"No começo, me assustei com tudo porque vivia numa bolha dentro de casa, sem amigos, apenas convivendo com filhos e marido... sempre muito retraída. Mas com o tempo, fui me adaptando porque não é fácil, a mente já não é a mesma de 29 anos atrás... Mas estou indo bem e, com muita dedicação, acho que chego lá", enfatizou ela.

Evasão maior entre mulheres

Realizado pelo Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará, o estudo "Infância, Gênero e Orçamento Público no Brasil" revela que questões como o machismo, a escassez de verbas e a ausência de políticas públicas voltadas para gênero contribuem significativamente para uma taxa de evasão escolar entre adolescentes e mulheres até 29 vezes maior do que entre os homens.

Os principais motivos apontados são as responsabilidades domésticas ou o cuidado com alguém, destacando-se a sobrecarga de tarefas e a falta de apoio social como fatores determinantes nesse contexto.

Planos após o diploma 

Andresa e Divania, agora determinadas a conquistar o diploma este ano, revelam quais são os planos após a prova. Afinal, nas palavras das amigas de longa data, "nunca é tarde para sonhar com um diploma".

Tenho muita vontade de fazer faculdade e, se Deus quiser, em 2025 estou fazendo o Enem.

"A importância dos estudos é me sentir útil para mim mesma e mostrar que sou capaz. E sim, tenho muita vontade de fazer faculdade e, se Deus quiser, em 2025 estou fazendo o Enem. Ainda não sei ao certo o que quero fazer, mas com certeza farei uma faculdade", enfatizou Andresa.

Por isso, penso em me formar na faculdade, mesmo aos 53 anos, porque estou bem e tenho esperança.

Divania complementa: "O estudo é fundamental para se realizar como profissional e adquirir conhecimento. É o caminho para se destacar na profissão desejada, pois sem um bom estudo, não se alcança o sucesso. Por isso, penso em me formar na faculdade, mesmo aos 53 anos, porque estou bem e tenho esperança de terminar o ensino médio".

O que é o Encceja 

As inscrições para o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja) 2024 encerraram-se no dia 10 de maio. A prova, de participação voluntária e gratuita, permite que jovens e adultos que não concluíram o ensino fundamental ou médio na idade adequada obtenham o diploma. Este ano, as provas serão aplicadas no dia 25 de agosto em todos os estados e no Distrito Federal.

O Encceja avalia competências, habilidades e saberes adquiridos tanto na vida escolar quanto extraescolar. O exame é composto por quatro provas objetivas, cada uma com 30 questões de múltipla escolha, além de uma proposta de redação. Não precisa estar matriculado em uma escola para realizar a prova.

Para o diploma de ensino fundamental, as matérias cobradas na prova são as seguintes: Ciências Naturais, Matemática, Língua Portuguesa, Língua Estrangeira, Artes, Educação Física, História e Geografia, além de Redação. 

No caso do ensino médio: Ciências da natureza e suas tecnologias (Química, Física e Biologia), Matemática e suas tecnologias, Linguagens e códigos e suas tecnologias e redação (Língua Portuguesa, Língua Estrangeira, Artes e Educação Física) e Ciências humanas e suas tecnologias (História, Geografia, Filosofia e Sociologia).