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    Dossiê Duas Rodas

    Por que o número de acidentes de moto explodiu? Especialistas explicam

    Série do ENFOCO mostra situação alarmante e aponta soluções

    Publicado 19/10/2025 às 7:25 | Autor: Tayná Ferreira
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    Niterói e São Gonçalo tem, em média, 19 acidentes de moto por dia
    Niterói e São Gonçalo tem, em média, 19 acidentes de moto por dia |  Foto: Arquivo Enfoco

    O número de acidentes envolvendo motocicletas, inclusive com mortes, tem aumentado drasticamente em Niterói e São Gonçalo. Segundo dados dos principais hospitais das duas cidades, são registrados, em média, pelo menos 19 acidentes por dia envolvendo motos. De hoje até quarta-feira (21), o ENFOCO publica o 'Dossiê Duas Rodas', trazendo à tona os problemas e as soluções propostas para essa 'pandemia' de tragédias. 

    Mesmo com ações de fiscalização e campanhas de conscientização sendo realizadas pelas autoridades, os esforços não têm sido suficientes para promover mudanças reais no comportamento dos condutores e reduzir a imprudência no trânsito. Especialistas apontam que medidas mais severas precisam ser adotadas com urgência, tanto na fiscalização quanto na punição, para evitar novas tragédias.

    Os dados alarmantes acenderam um alerta, principalmente após dois acidentes fatais ocorridos recentemente em Niterói. No dia 26 de setembro, dois jovens morreram após colidirem a motocicleta contra um ônibus na Estrada Francisco da Cruz Nunes, no trecho conhecido como Estrada da Garganta, na altura do Largo da Batalha. 

    Apenas três dias depois, uma jovem de 19 anos morreu em outro acidente de moto. Ela era passageira de uma motocicleta por aplicativo quando foi atingida por um ônibus na Avenida Prefeito Silva Picanço, em Charitas. Em ambos os casos, as vítimas morreram ainda no local.

    Na última sexta (17), mais um acidente terminou em morte no Ponto Cem Réis. 

    De acordo com Ângelo Alves, criador do curso Pilotagem Urbana, os principais fatores que contribuem para acidentes de moto são a falta de técnica e a imprudência.

    "A maioria das falhas nas vias pode ser superada com técnica. O que mais contribui para os acidentes é a falta de preparo dos condutores e o comportamento imprudente”, afirma.

    'Atestado de óbito antecipado'

    Já para o presidente da Associação dos Motofrentistas de Aplicativos e Autônomos do Brasil (AMABR), Edgar Francisco da Silva, os fatores mais comuns estão relacionados à falta de educação para o trânsito nas escolas, desde o ensino Fundamental até o Médio. Ainda segundo ele, o exame prático de habilitação desatualizado também contribui para o problema.

    “O exame prático é de 1980. São 45 anos sem nenhum tipo de modernização ou atualização. Com isso, as pessoas não aprendem como deveriam. No percurso, você anda a 5 km/h, sem trocar marchas, sem sentir a moto em uma curva. Isso não dá aptidão para ser um bom condutor. O trânsito de 1980 era outro; o de hoje é muito mais denso. Então, a pessoa tira a habilitação e já está apta a circular por qualquer via ou rodovia do país, mas sem o conhecimento necessário. É como se estivessem entregando um atestado de óbito antecipado”, afirmou.

    Engenheiro de transportes e professor titular da Universidade Federal Fluminense (UFF), Aurélio Lamare Soares Murta aponta que o crescimento acelerado da frota de motociclistas, aliado ao uso intensivo do veículo para deslocamentos curtos e trabalho, é o principal fator estrutural do aumento dos acidentes.

    Aspas da citação
    A isso somam-se comportamentos de risco, como excesso de velocidade, ultrapassagens indevidas e falta de equipamentos de proteção, além de infraestrutura viária inadequada, sinalização insuficiente e fiscalização limitada. A combinação de vias densas, com grande circulação e pouca prioridade à segurança do motociclista, cria um cenário de vulnerabilidade crescente
    Aurélio Lamare, engenheiro de transportes
    Aspas da citação

    Segundo Aurélio, o trânsito de Niterói e São Gonçalo possui características específicas que tornam as vias mais perigosas para os motociclistas.

    “As duas cidades apresentam contrastes socioespaciais acentuados. Niterói tem grande fluxo intermunicipal, especialmente com o Rio de Janeiro, e vias saturadas nos horários de pico. Já São Gonçalo possui uma malha viária extensa, com muitas vias estreitas e pavimentação irregular. Em ambas, a convivência entre carros, ônibus e motos em corredores compartilhados aumenta o risco. O relevo acidentado, os buracos e a falta de acostamentos seguros agravam ainda mais o problema”, detalha.

    Características do trânsito tambem contribuem para a ocorrência de acidentes
    Características do trânsito tambem contribuem para a ocorrência de acidentes |  Foto: Arquivo Enfoco

    Ângelo acrescenta que, segundo relatos de seus alunos, muitos acidentes são causados tanto por imprudência de outros motoristas quanto por falhas dos próprios motociclistas.

    Aspas da citação
    A maioria relata que os acidentes aconteceram por atitudes de outros motoristas, como falta de atenção ou desrespeito à moto. Mas também há casos em que outro motociclista foi o causador, ao forçar ultrapassagens
    Ângelo Alves, criador do curso Pilotagem Urbana
    Aspas da citação

    Os números

    Dados do Corpo de Bombeiros mostram que, entre janeiro e setembro deste ano, foram registrados 852 atendimentos a acidentes com motos em Niterói, um aumento de 12,25% em relação ao mesmo período de 2024, quando ocorreram 759 casos. Os tipos de acidentes mais comuns em Niterói envolvem:

    • Moto e carro: 663

    • Moto e moto: 107

    • Moto e ônibus: 27

    • Moto e bicicleta: 20

    • Caminhão e moto: 16

    • Moto e muro: 7

    • Outros (poste, van, etc.): média de 3 a 5 atendimentos

    Além disso, foram registradas 291 quedas de moto e 85 atropelamentos envolvendo motociclistas.

    Em São Gonçalo, também houve aumento. No mesmo período, o município contabilizou 817 atendimentos a acidentes com motos, contra 759 no mesmo intervalo do ano anterior. As ocorrências mais frequentes foram:

    • Moto e carro: 634

    • Moto e moto: 111

    • Moto e ônibus: 24

    • Caminhão e moto: 17

    • Moto e bicicleta: 15

    • Outros (poste, muro, van, etc.): entre 3 e 7 atendimentos

    Além disso, foram registradas 382 quedas de moto e 85 atropelamentos envolvendo motociclistas.

    Atendimentos hospitalares e óbitos

    Segundo a Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro (SES-RJ), o Hospital Estadual Azevedo Lima (Heal), em Niterói, registrou 737 atendimentos relacionados a acidentes com motos entre janeiro e agosto deste ano. Desses:

    • 266 foram por quedas;

    • 390 por colisões entre automóvel e moto;

    • 81 por colisões entre motos.

    O número representa uma redução na unidade em relação ao mesmo período de 2024, quando foram registrados 999 atendimentos.

    Já o Hospital Estadual Alberto Torres (Heat), em São Gonçalo — referência em traumas —, atendeu 3.972 vítimas de acidentes com moto no mesmo período, contra 3.167 no ano anterior, o que representa um aumento de 20,26%.

    Somando as duas unidades, foram registrados 85 óbitos relacionados a acidentes com motocicletas entre janeiro e agosto deste ano.

    Entre 2019 e 2025, os dois hospitais somaram 45.099 atendimentos e 1.048 mortes confirmadas.

    • 2019: 146 óbitos

    • 2020: 147

    • 2021: 164

    • 2022: 159

    • 2023: 147

    • 2024: 200

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    Tayná Ferreira

    Tayná Ferreira

    Repórter sob Supervisão

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